SELVAGENS. HOMEM DE OLHOS TRISTES
Coisas e Coisas

SELVAGENS. HOMEM DE OLHOS TRISTES



Foi das peças mais duras que vi nos últimos anos.

O teatro da Cornucópia habituou-nos a fortes densidades psicológicas, a dramas familiares e sociais de elevada complexidade, em que o destino humano segue por caminhos incompreensíveis. O Teatro Aberto conduz-nos frequentemente a histórias com fundo sociológico onde se descobrem indivíduos cuja filosofia de vida nos acaba por contagiar.


Dito de modo mais simples: se na Cornucópia a humanidade é condenada às evidências físicas e morais de um patamar superior e não evidente - onde se não descortinam evidências para lutas tão ferozes - no Aberto saímos igualmente preocupados mas não sufocados.

A peça em cena no Teatro Aberto, Selvagens. Homem de olhos tristes, de Händl Klaus, foge, de acordo com a minha leitura, do cânone habitual daquele teatro. Primeiro, a história torna-se densa e confusa. Se, no começo, nos parece tratar-se do assédio perigoso de dois jovens junto de um velho - o roubo como móbil -, a narrativa acaba por nos mostrar o desnudamento. Eis o segundo elemento a distinguir: desnudamento psicológico (em referências, nas vontades adiadas pelas circunstâncias) e físico (perder a roupa, mostrar o corpo, tornar-se indefeso). O desnudamento é ainda físico de outro modo: o envelhecimento do corpo, a magreza do corpo, os olhos avermelhados, o rosto distorcido pela doença.



Aquilo que o catálogo da peça indica - as deixas de uma personagem continuadas por outra, ilustrando a função do diálogo, com conversas nunca encerradas e resolvidas definitivamente - marca um terceiro elemento da peça. O retomar da conversa transporta-se para os espaços psicológicos e físicos das personagens. Cada personagem articula-se às outras, simultaneamente em cumplicidade e na busca social do entendimento.

João Perry (o Hugo de Belamonte) e Gracinda Nave (em Ema Flick) desempenham papéis muito difíceis. Eles estão mesmo à nossa frente, mostrando a fragilidade de seres humanos, quase perdidos na teia de acontecimentos, quase desprovidos de raciocínio, com medos ancestrais em cima de si, quase autómatos a quem se retirou a pele da cultura, encerrados dentro de um espaço claustrofóbico mas de uma brancura asséptica.

Talvez por isso - e pela história não linear - o público foi parco em aplausos. A mostrar desconforto.

O cenário, de João Mendes Ribeiro, é admirável. Volumes pesados, que ampliam os receios de cada personagem, através de sombras e de linhas oblíquas, de caixas onde as personagens se escondem ou sobem e saltam.



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