Coisas e Coisas
As Raposas
Luísa Cruz desempenha muito bem o papel de Regina Giddens na peça
As Raposas, de Lillian Hellman. Não é um registo autobiográfico da escritora, apesar dela ter observado uma realidade semelhante na sua infância, a dos jogos de poder dentro da família. Cada elemento vangloriava-se de ser mais rico e hábil nos negócios que os outros familiares, tema usado com frequência nas reuniões familiares mais ou menos regulares à volta da mesa. A Regina da peça representada no Teatro Aberto é paciente, tenaz e dura para com os irmãos e o marido. Ela sabe esperar o seu momento de ataque, aliás secundada por um dos irmãos, Benjamin Hilton (Virgílio Castelo), que, no final, reconhece que perdeu mas há mais situações no futuro. O mundo, a seus olhos, é construído por ganhos e perdas, processo dinâmico a que os mais fortes e ágeis estão atentos.
O cenário fixo, desenhado por António Casimiro e João Lourenço , decompõe-se em três espaços. A sala, onde decorre a maioria dos diálogos, o fundo, de entrada para a casa e onde se observa o verde da paisagem, a escada, onde o desenlace se dá: Henrique Giddens, regressado a casa após vários meses numa clínica, morre de ataque cardíaco no momento em que procurava um remédio. A mulher, Regina, mantém-se fria sentada no sofá à espera que ele morra. Em jogo estavam 30 milhões de euros em ações, roubados pelo sobrinho Leonardo (Pedro Caeiro) e que Henrique não queria que fossem para Regina. Roubo, traição, perfídia e interesses individuais face ao coletivo são tópicos fundamentais da peça.
Das outras personagens, retive a de Betty Hilton (Gracinda Nave), a mulher-boneca e que foi a oportunidade para Oscar Hilton (Marco Delgado) aceder à riqueza e aristocracia à moda americana. Hábil a tocar piano, ela confessa não saber fazer nada na vida e passa os dias a beber para esquecer a perdida Quinta dos Leões e o tempo dos seus pais, que procuravam ser mais honestos entre si e respeitosos da condição dos seus trabalhadores. O negócio, agora em desenvolvimento, com a entrada de um financeiro para expandir linhas de produtos, William Marshall (Eurico Lopes), permitia um leve sonho dela regressar a esse tempo de inocência. Mas os restantes elementos da família logo se encarregaram de eliminar essa possibilidade.
A peça teve adaptação ao cinema em 1941, com realização de William Wyler e Bette Davies no papel de Regina, e à ópera em 1947, com o título
Regina e música de Marc Blitzsein. Em Portugal, a peça, com o título
As Pequenas Raposas, foi estreada em 1966, com Eunice Muñoz, Maria Lalande, Rogério Paulo, Henriqueta Maia e João Perry, entre outros. Então, Perry fazia de Leonardo, o filho de Oscar que roubou as ações de Henrique; agora, faz o papel do mais velho.
Por instantes, a partir das diferentes posições de cada membro da família representada, lembrei-me da história do banqueiro Ricardo Salgado, da família deste e do Banco Espírito Santo.
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