Entrevista: Euclides da Cunha, o corno, o mito
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Entrevista: Euclides da Cunha, o corno, o mito


Ele podia ser um jornalista e escritor ilustre apenas por sua grande obra, “Os Sertões”, mas Euclides da Cunha ainda é muito lembrado por ter sido corno. Um dos cornos mais famosos da imprensa brasileira. Morto pelo próprio Ricardão no duelo por sua honra, Euclides calou-se. Um século e muitas piadinhas depois, ele resolveu romper o silêncio. O blog Desilusões perdidas, que adora polêmica e sensacionalismo, conseguiu esta exclusiva com Euclides, com a ajuda, claro, de um médium.

Euclides, como é carregar esta fama de jornalista traído por um século?

Duda, meu caro, em primeiro lugar, quero agradecer a oportunidade que você está me dando de falar sobre o assunto. É um tema muito espinhoso para mim, mas chegou a hora de me abrir. Apesar de toda minha contribuição ao jornalismo, à literatura, as pessoas ainda preferem dar um peso maior à futricagem, às maledicências. Há pouco, acompanhei a minissérie Desejo e o que vi foi degradante.

Você assistiu à minissérie? Como?

Desde que aquele gaúcho, o Werner Schünemann, assumiu o Ministério da Comunicação aqui no nosso lar, o acesso às tecnologias de comunicação ficou muito maior. Temos notebook, internet, 3G, wireless, TV a cabo. Note que minha linguagem está moderna. Incorporei até algumas gírias. Não vi Desejo em sua exibição original, apenas a reprise no Canal Viva.

E por que achou degradante?

Justamente pelo grande enfoque dado à minha cornitude. Não valorizam o meu trabalho. “Os Sertões” é sucesso internacional. A obra foi traduzida para vários idiomas. Isso muito antes de Paulo Coelho. E tem outra: a produção da minissérie ainda foi muito generosa com a minha ex-mulher. Vera Fischer? Tá maluco? Anna Emília sempre foi muito nota 3, nota 4. Se ela fosse um mulherão, eu teria me preocupado mais com ela. Sempre saí de viagem sossegado, porque sabia que ninguém cobiçaria a minha mulher nota 4. Mas cobiçaram. Neguinho não perdoa.

O trabalho árduo e as longas viagens são a principal razão da vulnerabilidade dos jornalistas?

Sem dúvida. Mas, hoje, pelo que tenho acompanhado, os jornalistas estão mais protegidos.

Mais protegidos? Como assim?

Mais protegidos. Veja o caso daquele repórter da Globo que foi para a Líbia, o carequinha...

Marcos Uchôa.

Esse mesmo. Marcos Uchôa. Note que aquele capacete que ele usa é especial para proteger os cornos. Isso dá segurança ao jornalista que tem de viajar para uma grande cobertura. O cara até levou uma bronca do Bonner quando estava sem o capacete.

Mas a cornitude é um problema ainda comum na imprensa brasileira.

O que mudou muito é a questão da aceitação. Hoje, os jornalistas aceitam mais a cornitude. Na minha época, a gente chamava para o duelo, tinha aquela coisa de limpar a honra. Hoje, o sujeito leva um chifre e faz o quê? Vai pro terapeuta? Faz um swing com o Ricardão? No meu tempo, havia um engajamento muito mais forte da imprensa contra o chifre.

Eu também fui vítima deste problema e, embora não tenha chamado o Ricardão para o duelo, não aceitei a minha cornitude numa boa. Sei que é uma questão bem complexa. Mas, hoje, consegui superar o chifre. Imagino que você, Euclides, também já superou este trauma, não?

Meu caso é mais difícil, porque tem sempre gente lembrando. Aqui mesmo no nosso lar, neguinho ainda me sacaneia. Tô na fila da reencarnação há mais de 50 anos, mas a minha senha ainda não foi chamada. Acho que só assim para o meu pesadelo acabar.

Quando reencarnar, toparia voltar como jornalista?

Fica complicado voltar como jornalista nos dias de hoje porque as grandes matérias que eu gostava de fazer não existem mais. Seria um retrocesso. E a proposta da reencarnação é a evolução.

Que dicas daria aos jornalistas para evitar o chifre?

Por mais que uma grande dedicação ao trabalho seja necessária, nunca esqueça de dar atenção à sua mulher, mesmo que ela não seja uma Vera Fischer. Uma Vera Fischer no auge, digo. Ligar para casa antes de chegar também é de bom-tom. Mas não adianta ligar quando já está chegando. Pelo menos, uma meia hora antes. O que os olhos não vêem a testa não sente. Outra coisa: caso a sua mulher não seja jornalista, não fique falando o tempo todo de trabalho com ela, porque isso, Duda, com o perdão da palavra, é chato pra cacete.



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