PÚBLICOS DE CULTURA
Coisas e Coisas

PÚBLICOS DE CULTURA



No passado dia 22 de Setembro, comentei aqui um texto recente de
João Teixeira Lopes, Da democratização à democracia cultural. Uma reflexão sobre políticas culturais e espaço público. Igualmente editado este ano, João Teixeira Lopes e Bárbara Aibéo escreveram Os públicos da cultura em Santa Maria da Feira (ed. Afrontamento).

Depois de um primeiro capítulo - onde os autores abordam rapidamente a definição de público e as metodologias usadas em estudos deste tipo -, Lopes e Aibéo analisam as áreas de programação cultural, a programação cultural vista pelos públicos, as práticas culturais e os perfis dos praticantes culturais.

Volume pequeno (70 páginas), considerei de particular relevo os dois últimos capítulos. Nas práticas culturais, distinguem-se a cultura de apartamento (os consumos domésticos, em especial os de televisão e de música gravada) e a cultura de saídas (p. 41). São estas as práticas culturais generalizadas. Mas os autores trabalham igualmente a mobilidade ligada aos tempos livres e distinguem entre passear e viajar, com o primeiro a implicar um nomadismo quotidiano ou de fim-de-semana associado a deslocações curtas, representativo de estruturas e instituições tradicionais, e o segundo a exigir recursos elevados, ligado a universos simbólicos cosmopolitas (p. 43). As práticas culturais definem ainda o envelhecimento cultural, que é quando o indivíduo baixa o volume de cultura de saída e aumenta a prática de cultura de apartamento. Os 26 anos são a idade de fronteira, neste estudo, entre cultura de saída e cultura de apartamento. A investigação envolveu 1873 inquéritos e 42 entrevistas a informantes ligados à oferta de programação cultural no concelho de Santa Maria da Feira (p. 11).

A economia mediático-publicitária (medida por mais saídas para concertos e menos idas ao museu) constitui um primeiro patamar para a captação de públicos: 1) habituais, 2) erráticos (vão ou podem não ir) e 3) raros (p. 24). Depois, destacam-se os públicos fáceis, em especial os em idade escolar e que, devido aos programas escolares, visitam regularmente bibliotecas, museus e outros espaços culturais (p. 39).


No capítulo sobre os perfis dos praticantes culturais, Lopes e Aibéo distinguem quatro públicos, no que é a sua construção teórica: 1) ecletismo cultivado (praticantes cultos, jovens, com altos níveis de escolaridade e de classe social privilegiada), 2) activismo popular (esfera da criação sem autor, como teatro amador e cantar-dançar-tocar um instrumento, público jovem na transição para a vida adulta e em contexto de menor capital cultural), 3) doméstico convivial (hibridismo entre convivialidade doméstica e urbana, como a ida ao café, bar e discoteca), e 4) doméstico audiovisual (práticas culturais ancoradas no lar, com indivíduos com menores recursos escolares, já profissionalizados e vivendo situações de conjugalidade (p. 57).

Dois comentários, o primeiro dos quais sobre as categorias do quadro IX (lugar de classe de cada inquirido). Elas não são explicadas no texto, mas apenas remetidas para a bibliografia do assunto, o que é escasso para quem quer usar o livro como elemento pedagógico (pp. 23 e 67). Quando, na mesma página 23, os autores indicam ter havido um alargamento social de públicos, o texto não dá provas do mesmo. O segundo comentário, extensível ao texto de João Teixeira Lopes acima identificado e aos trabalhos do Observatório das Actividades Culturais, é que o conceito de audiência não entra sequer na discussão teórica. Os consumos de televisão são enquadrados na categoria de público, o que não é de todo pacífico.



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