Pequenos casos de amor
Coisas e Coisas

Pequenos casos de amor


Alessandro trabalhava na redação como office-boy. Cuidava do papel da impressora, do papel do fax, comprava cigarro na padoca para os repórteres mais folgados. Era preto, pobre e nunca tinha grandes oportunidades na vida. Era também curioso. Ficava observando o trabalho dos jornalistas e começou a se encantar pela coisa. Um dia pediu ao editor de Cultura que lesse um texto que ele havia escrito sobre uma peça teatral. “Então, você gosta de teatro?”, perguntou o editor. “Sempre que tem peça de graça eu vou.” O editor corrigiu um problema de ortografia aqui, uma crase errada ali, deslizes que até jornalista profissional comete. No geral, gostou bastante do que leu. Texto enxuto, bem sacado, sem afetação. A partir daquele dia, Alessandro começou a colaborar na produção do roteiro cultural da semana. Era uma espécie de assistente do estagiário, cargo que, convenhamos, é nada interessante. Mas Alessandro achou o máximo. Os jornalistas, empolgados com o tesão que o menino mostrava, resolveram fazer uma vaquinha para bancar a faculdade de jornalismo para ele. Alguns repórteres mal tinham dinheiro para pagar o aluguel do apê em que moravam, mas colaboraram mesmo assim. Alessandro estudou jornalismo e conseguiu o diploma que, naquela época, ainda valia alguma coisa. Hoje, é repórter do caderno de Cultura e faz matérias sobre teatro, sobre cinema, música. Ah, e sabe tudo de crase também.


Motorista do jornal, Teixeira vivia nas ruas e criou uma grande intimidade com as cenas inesperadas. Enquanto seus colegas de profissão dedicavam-se à arte de jogar conversa fora, difamar a vida alheia e paquerar “princesas” por todos os cantos da cidade, Teixeira atentava-se a fatos, a imagens. Um dia comprou uma máquina fotográfica simples e de segunda mão e a deixou guardada no porta-luvas de seu carro. Em casa, a patroa protestou. “Mas o que deu na sua cabeça, homem, de querer virar fotógrafo? Deu para gastar dinheiro com essas besteiras agora?” Sempre que podia, Teixeira registrava uma cena. Começou com coisas banais. Os fotógrafos do jornal, camaradas, faziam a revelação de seus filmes no estúdio da redação. Um dia, o editor de Arte viu uma fotografia perdida sobre uma mesa. Pivetes tomando banho no chafariz de uma praça. Achou a imagem poética. “Porra, a foto é de quem? Que Teixeira? O motorista?” Tempos depois, Teixeira, o motorista, foi o único a conseguir registrar o exato momento da execução de um sem-teto em confronto com a polícia. Ganhou a capa do jornal. Os fotógrafos, empolgados com seu talento, resolveram fazer uma vaquinha para comprar uma máquina profissional para ele. Alguns mal tinham dinheiro para pagar a conta da luz, mas colaboraram mesmo assim. Hoje, Teixeira faz até exposição de fotos. A patroa ficou toda orgulhosa. “Que talento tem esse homem!”



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