Azeredo Lopes, professor da Universidade Católica (Porto) e presidente da ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) desde começos deste ano, mostra-se prudente em algumas matérias. É de realçar isto, dada a delicadeza da área onde trabalha.
De alguns pontos onde essa sensibilidade é maior, destaco: 1) renovação das licenças de televisão (SIC e TVI), apesar de um dos jornalistas - pelo jornal não se sabe se a pegunta foi feita por José Manuel Fernandes (Público) ou Graça Franco (Rádio Renascença) - falar de um projecto (TVI) que já nada tem a ver com a atribuição da licença inicial, 2) relação nada amigável entre presidente da Câmara do Porto e o jornal Público, 3) lei da concentração dos media, 4) independência da ERC, apesar da nomeação dos seus dirigentes a partir da Assembleia da República.
Dessa prudência respigo duas ideias. A primeira logo no começo do texto, quando, em lead, se lê que Azeredo Lopes entende que a ERC deve ter uma agenda própria, não determinada por pressões políticas (deve ler-se: partidárias). A segunda vem em resposta à queixa apresentada por Manuel Maria Carrilho, ainda reportado às eleições autárquicas em que aquele político e docente universitário se candidatou à liderança de Lisboa. Se Carrilho pediu uma intervenção, a ERC está a fazer um trabalho cauteloso (talvez lento em excesso) de definir critérios de abordagem e de selecção de pessoas a ouvir para formar uma posição.
Há um tema que me parece Azeredo Lopes ter escapado sem ter dado uma resposta adequada. Refiro-me à lei da concentração. Quando se lhe pergunta se vê com agrado o reforço da ERC nessa matéria, responde não ter de se pronunciar sobre tal. À questão de um critério de medir a concentração ser o indicador de mais de 50% de audiência, Azeredo Lopes responde que tradicionalmente a concentração dos media tem uma relação inversa com o pluralismo (destacado colorido meu). Ora, se há uma aferição tradicional, qual será a moderna?
Das leituras que tenho feito, nomeadamente da investigação de Gillian Doyle (e que um livro muito recente de Luís Oliveira Martins sobre mercados de televisão retoma), não há uma regra moderna na relação concentração versus pluralismo. O serviço público de televisão implica, segundo a minha perspectiva, pluralismo. A atribuição de licenças em televisão pressupõe já essa prestação de serviço público, pelo que basta verificar o comportamento dos canais. E, a haver concentração excessiva, ela reside na publicidade, como tem escrito Paulo Faustino.
Um segundo tema que, pela enunciação simples, me parece perturbador é a resposta evasiva à hipótese de detenção da propriedade de media ser apenas da responsabilidade das empresas que têm por objecto social a comunicação social [diz: "É uma leitura possível a que não posso responder", esperando pela decisão do ministro]. O exemplo descrito no jornal é o Público pertencer à Sonae, que tem outros objectos sociais. Se assim acontecer, o jornal terá de ser vendido, o que me parece um disparate. Estou a pensar na imprensa regional, muito fraca e dependente de entidades proprietárias ligadas a actividades industriais que não os media. Esses jornais vão ser vendidos necessariamente? E quem fica com eles?
Dos blogues que consulto regularmente, o Atrium, de Luís António Santos, e o Blogouve-se, de João Paulo Meneses, fizeram referência à entrevista, destacando a questão do relacionamento de Rui Rio e a Câmara Municipal do Porto versus Público. Para mim, parece-me excessivo o destaque no jornal a este tema conflituoso, com uma clara assunção de um ponto de vista quando o próprio jornal é parte nesse ponto de vista, o que colide com a isenção e a objectividade que se quer dos jornais.