Coisas e Coisas
E depois criticam a mãe Dinah
De pijama e chinelão no aconchego do meu apê de 49 metros quadrados, acompanhei, nos últimos dois dias, as notícias do desaparecimento do avião da Air France. Mais uma tragédia para a imprensa dissecar até o bagaço. Só se fala disso nos telejornais, na mídia impressa, nas rádios, na internê. Esqueceram a quebra da GM, a enchente no Piauí e a ameaça de a Coréia do Norte jogar bosta nuclear no ventilador. A desgraça do momento é outra!
A falta de informação aliada à necessidade de furar a concorrência é uma mistura desastrosa. Choveu especialista comentando o que ninguém sabe ao certo o que aconteceu. Hipóteses aqui, suspeitas ali, análises vazias acolá. Um jogo de adivinhações. A princípio, um raio poderia ter sido a causa principal da “queda”. Horas mais tarde, essa versão passou a ser absurda. Já falaram em pane elétrica, zona de convergência intertropical, turbulência, bomba. Daqui a pouco a culpa será do Dunga. Depois criticam quando a mãe Dinah fala alguma besteira.
É fato que, no primeiro dia da cobertura, era mais fácil encontrar um político honesto em Brasília do que algum dado oficial sobre a tragédia. Nessas horas, o problema para o jornalista é ter a obrigação de informar o público a todo o momento sem ter nada de novo para acrescentar. Vira um vale-tudo danado. Alguns coleguinhas chegaram a matar 80 brasileiros; depois este número caiu para 59, 58. Jornalista é ruim de matemática mesmo!
A carga de dramaticidade também é proporcional ao tamanho da tragédia. O desespero dos familiares em busca de notícias nos aeroportos, por exemplo, sempre foi um prato cheio para os urubus de plantão, principalmente de programas sensacionalistas. A Air France, pelo menos, reservou uma área especial para receber parentes e amigos dos passageiros e não deixá-los tão expostos. Bem, podem meter o pau na imprensa, mas o público também adora se deliciar com todos os detalhes da desgraça alheia. Coisa de ser humano.
E como não poderia ser diferente, a partir de agora vão pipocar as matérias sobre segurança nos vôos, o papel das autoridades, a responsabilidade das empresas aéreas e aquele blablablá todo que já conhecemos. Depois, a gente esquece a tragédia e tudo volta ao normal, sem soluções para os problemas. A vida e a pauta diária seguem. Até a queda do próximo avião.
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