Eis que então, o menino olhava estarrecido para aquela criatura gorda parada em sua frente. Os olhos esbugalhados. A respiração trancada. Os dedos crispados. O cabelo em pé. Um arrepio percorria sua coluna desde cima até embaixo. Sim, apertava as nádegas. Era isso ou um tipo de acidente mais vergonhoso ainda. Cinco segundos haviam se passado desde que acendeu a luz da sala, mas pareciam horas. O cara de vermelho também olhava para ele. Não parecia assustado. Provavelmente não era a primeira vez que era surpreendido nessa situação. Mais cinco segundos e o clima já começava a se tornar estranho. Afinal, qualquer susto, uma hora, tem que acabar.
O menino respirou então profundamente. Parecia que tinha acabado de sair de um mergulho. Encheu os pulmões de ar e soltou, de uma só vez:
- Hey, Santa, what the fuck!?!
Não, não era um menino americano. Tampouco falava inglês. Mas, talvez a expressão ficasse melhor nessa língua. Convenhamos "Porra, Papai Noel, que merda é essa?" não fica bem num texto natalino. O caso é que o menino soltou uma frase meio medonha e o Santa/Noel não fez outra coisa a não ser rir. Sim, senhoras e senhores, ele existe e faz "Ho, ho, ho!". Pelo menos enquanto, no Brasil, não for também proibido.
O menino então, pediu desculpas e foi em direção ao velhinho. O gordinho pensou que o menino viesse em sua direção para abraçá-lo. Não foi o que aconteceu. O menino foi direto para a sua barba. Puxou com força. Não saía. Então o menino examinou a roupa. Não era aquele cetim barato e brilhoso. Era um tecido que não tinha uma única cor. Se de longe a gente o enxerga vermelho, de perto ele é multicor. Quando a gente toca saem raios. Ao toque, o tecido nos acaricia, nos convida.
O menino se assusta. Afasta-se. Seu coração bate forte. Lágrimas ameaçam rolar. O Sr. Santa/Noel sorri. Ele parece não ter sido criado para outra coisa. Ele olha o menino e sorri. Pronto. Simples assim. O menino respira fundo. Sua cabeça gira em espiral. Ele chora, muito. Mas não é um choro angustiante. É um choro que lava sua alma. Papai Noel então, abre os braços. O menino corre em sua direção e o abraça. O menino soluça e murmura:
- Eu sabia! Eu sabia...
Novamente o tempo parece parar. Aquele abraço dura uns três anos, se formos contar pela passagem normal. O menino chorou dois rios e meio. Papai Noel sorriu, como sempre, enquanto tudo não levou mais do que um minuto. Depois disso, o menino virou as costas e foi saindo, em direção ao seu quarto.
- Espere...
Disse o Papai Noel, ao lado da árvore.
- Já que você me encontrou, vou deixar você escolher seu presente. Pode pedir o que quiser. Eu lhe garanto que vai se realizar.
O menino pensou e disse:
- Eu queria que todo mundo que eu conheço, que foi bom pra mim, que me desejou coisas boas, que fez a coisa certa quando podia... eu queria que todos eles tivessem uma boa vida, uma nova chance...
- E os outros? Os que te magoaram, te mentiram, que não fizeram o que era certo...
- Eles?
- Sim.
- Eu queria que todos eles tivessem uma boa vida, uma nova chance... também!