Coisas e Coisas
Comoção!
Tentou se controlar. Em vão. Passou o dia imaginando uma historinha bonitinha, que realmente pudesse agradar a todos. No fundo, no fundo, tinha a necessidade de agradar. Mas, sempre que se colocava em frente ao teclado, era traído por seus instintos. Eram flashes que insistiam em vir à sua mente. Imagens pouco agradáveis. Estava passando por esta fase desagradável, como tantos haviam dito. Seus pensamentos estavam repletos de fumaça de cigarro, mesmo que não fumasse. Seus heróis estavam bêbados, mesmo que não bebesse. E confusos, também. Sua pontuação era inadequada. Seus pensamentos, também. Imagens desconexas, como havia dito aquele outro rapaz, num daqueles malditos recados.
O ruído do relógio era clichê e insuportável, ao mesmo tempo. Suas pernas já estavam começando a ficar dormentes. Seus olhos ardiam. Sua vontade aumentando. Impulsos, necessidade de colocar algo sobre a tela. Foi pro banho.
P A U S A
Uma música poderia auxiliar. Colocou uma qualquer a tocar. Looping, era o nome da função que fazia aquela porra repetir indefinidamente. Para dar uma certa noção de ritmo, intensidade e, talvez, até uma insp...
C L I C H Ê
Segurando os óculos com o polegar, o indicar e o anular, passava a base do punho no
rosto. A pele oleosa, mesmo após o banho recente, fazia um ruído baixo. Quase imperceptível. Quase. Subindo pelo nariz, passava pela testa e chegava à fronte. Daí fazia movimentos circulares pelos olhos. Como se quisesse enviar o punho todo pela cavidade. A pele cedia ao movimento. Suava. Sentia calor num dia que todos poderiam chamar de agradável. Será que estava febril? Não sentia sede.
B R A N C O
- Tá na hora de um pouco de comoção. Tá faltando ação!
- Vai te fudê... Quer ação? Assiste novela.
S I L Ê N C I O
Decidiu tentar novamente. Sentou-se de maneira mais precisa na cadeira em frente ao computador. Começou a digitar tudo o que vinha à sua cabeça. Nunca houve tanta necessidade de um corretor ortográfico. Foda-se. Depois o Word corrige tudo. Precisa criar algo novo, sem sangue, sem seriais killers, sem mortes, sem imagens dramáticas, sem apelação. Algo realmente que o impulsionasse adiante. Antes não escrevia palavrões em seu texto. Hoje em dia, andava ávido para soltar um merda. Cacete! As pessoas não têm a mínima noção de como pode ser doloroso escrever. Elas acham que é somente sentar e ir colocando tranquilamente suas idéias no papel. Papel? Isso nem existe mais. Há quanto tempo não escrevia em uma folha de papel de verdade. Não tinha romantismo com a profissão. Pagar as contas e viver tranquilo. Eram suas ambições. E escrita automática, definitivamente, não era sua praia.
P A U S A F O R Ç A D A
No fim, não conseguiu! A coisa saiu toda meio torta. Sem ação. Sem comoção. Pelo menos desta vez não havia matado ninguém. Talvez por isso ainda houvesse alguma esperança. Decidiu fumar um cigarro. Eu sei que não fumava. Mas comprava cigarros e os deixava queimando sobre o cinzeiro. Ajudava a criar um clima mais criativo. Clichê. Muito cinema americano. Devia parar de tentar escrever contos.
P A R O U
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