Coisas e Coisas
Carne Fresca
Caminho pelas ruas de madrugada. O pouco do álcool que bebi não me ajuda a enxergar as coisas mais claramente. Entre um tropeço e outro, procuro por companhia. Na verdade, sexo. Não há mais motivos para mentir, não é mesmo?
Estive até a pouco em um bar de segunda. As bebidas não eram de uma procedência muito confiável. O uísque 12 anos devia ter umas 12 semanas... e olhe lá. Enxergo tudo através de uma lente embaçada. Pelo desejo. Pelo clima. Pelo nevoeiro.
Acabo de dobrar uma esquina e enxergo algo que parece ser uma mulher.
Para mim, nesta hora, ela é linda. Poderia ser de outra forma?
Ela me olha, do outro lado da rua. Me olha e sorri, para mim. Um sorriso embaçado pelo álcool. Mas que me convence a segui-la.
Da rua à porta são questões de segundos. Da porta da casa à porta do quarto, outros tantos. Primeiro é a saia que cai ao chão, depois o sutiã. Nua... e embaçadamente linda. Cheirosa. Desejável.
Eu seria capaz de tragá-la inteira... mesmo bêbado. Mesmo trôpego eu teria desejo suficiente para descarná-la e comê-la. Inteira.
Da cama ela me puxa para a mesa de jantar. Deita-se sobre a mesa como uma oferenda. Uma refeição para mil talheres. Se em algum momento eu estava usando roupas, não me lembro. Agora eu sou somente um falo. Nada em mim existe que não seja o desejo.
Quando eu entro nela é o paraíso. Ela é meu alimento. Eu sou o dela.
Um baque surdo e caio no chão. Mas, é como se o chão estivesse há, no mínimo, 03 metros abaixo dos pés. Levanto a cabeça e a vejo me olhando lá de cima. A porta do alçapão ainda balança lentamente.
Tudo escurece, menos a luz suave que emana dela. Lá em cima, me olhando e sorrindo... acho.
Aos poucos o alçapão vai se fechando. A escuridão vai tomando conta do lugar onde estou. Eu ainda tento olhar para cima e falar algo. Não há mais tempo.
No escuro. No silêncio. Não sei mais se minha vista está embaçada ou não. Não sinto meu corpo. Apenas escuto. Primeiro um silêncio mortal. Aos poucos consigo distinguir minha respiração... e outra.
Não estou sozinho aqui.
Escuto.
Alguém caminha sobre um chão úmido.
Escuto.
Uma lâmina corta a pele.
Gotas de sangue tocam o chão.
Escuto.
Um homem agarra meu corpo sem vida e joga sobre uma mesa.
O sangue escorre pela minha garganta e se acumula sobre a placa de alumínio.
Escorre pelo ralo.
Escuto.
Ele amarra minhas pernas com uma tira de couro. Ergue-as. O sangue escorre mais rápido. Aos poucos vou perdendo a cor. Tudo ao redor vai ficando excessivamente branco. Quanto mais lento o sangue começa a escorrer, mais para o alto minhas pernas são puxadas. Estou quase de cabeça para baixo. Estou quase sem sangue. Quanto tempo passou?
Agora consigo ver a cena por inteiro.
Eu sou um pedaço de carne.
Ele é meu açougueiro.
Ele maneja as facas com maestria. Separa parte por parte. Desossa. Limpa. Fatia.
Tudo muito limpo.
Tudo muito rápido.
Não devo ter sido a primeira vítima.
(Livremente inspirado no primeiro capítulo do livro “Canibais – Paixão e Morte na Rua do Arvoredo” de David Coimbra)
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