Coisas e Coisas
Me dá uma pauta aí
Ele até conseguia suportar a rejeição da menina que amava, do pai, que queria um filho médico, mas não a rejeição do pauteiro. Tem dor maior para a alma de um jovem repórter do que a dor de ficar sem pauta? Enquanto os outros repórteres estavam na rua, apurando, investigando, vivendo, o jovem repórter sem pauta estava condenado à melancolia da redação, lendo o horóscopo do dia, fazendo pesquisas no arquivo, fingindo viver.
Nas reuniões de pauta semanais, que definiam as matérias das edições seguintes, o jovem repórter ficava no seu canto, diminuído, invisível. Para passar o tempo e enganar o constrangimento, rabiscava, dezenas de vezes, o seu nome numa folha de papel. Quando estava muito irritado com a situação – quase sempre –, costumava rabiscar “pauteiro filho-da-puta”.
Todos já estavam deixando a sala de reunião e ele, tímido, esboçou uma reação.
- Oi, senhor... senhor pauteiro? Olha, eu fiquei sem pauta de novo esta semana. Não tem nada que eu possa fazer, ajudar em alguma matéria especial?
O pauteiro sugeriu a ele redigir mais um daqueles perfis de gaveta, que são publicados na ocasião da morte de pessoas famosas.
- Mas, senhor, a trajetória pessoal e profissional da Hebe Camargo eu já escrevi na semana passada. Passei dois dias no arquivo só fazendo pesquisa, o senhor não lembra? Não tem pelo menos alguém diferente pra gente matar esta semana?
Foi pra isso que eu estudei quatro anos?, refletia, no ônibus, na volta para casa. Quando a gente está na faculdade, não vê a hora de começar a trabalhar de verdade. Então eu chego à redação e é esse o meu destino, o ceifador de vidas de celebridades?
Já pensava em estudar Medicina – por que não ouvi o meu pai? – quando um repórter mais velho e gente boa lhe deu uma dica.
- Rapaz, não fique esperando pela pauta! Você é quem tem que sugerir a pauta. Pare de reclamar e coloque essa cabeça pra funcionar. Cadê a porra da pró-atividade?
Na reunião de pauta seguinte, chegou cheio de idéias. A excitação era tanta que nem se lembrou dos rabiscos. Mas a reunião foi mais breve e ele não conseguiu apresentar as sugestões ao pauteiro. Mesmo assim, estava empolgado. Sabia que a grande oportunidade chegaria. E só dependia dele. Naquela tarde, enquanto pesquisava a vida e a obra de Elza Soares no arquivo, até sorriu. Seus dias de jornalismo mórbido estavam perto do fim.
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