Manual de adaptação para um jornalista velho
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Manual de adaptação para um jornalista velho


Você ficou um longo tempo afastado do mercado de trabalho e, agora, com 50 e muitos anos e hábitos jurássicos, resolveu voltar a uma redação jovem e diferente. Sobreviverá? Sucumbirá? O blog apresenta aqui dicas essenciais para você, jornalista velho.


Não banque o saudosista. Você corre o risco de ser visto como “o chato”. Nostalgia funciona bem num especial de fim de ano do Roberto Carlos, mas não no dia a dia de uma redação jovem. Nada de ficar repetindo que antigamente tudo era melhor, que era gostoso ouvir o barulho das máquinas de escrever, que se podia fumar tranquilamente enquanto se trabalhava, que se tinha mais tesão pela profissão. Valorize o presente com frases como “Irado este iPad!” ou “Que bom trabalhar 15 horas sem parar!”.

Atualize-se quanto aos termos jornalísticos. Copydesk é coisa do passado. Hoje, os jornalistas recorrem ao corretor ortográfico do Word. Se você não quiser ser chamado de repórter das cavernas, não ouse mencionar palavras do tipo paste-up, paica, calhau e drops. Os jovens vão pensar: “Que merda esse tiozinho tá falando?”. Aprenda termos do século 21, como jornalismo colaborativo e convergência de mídias. Seja um coroa antenado.

Renove seu jeito de vestir. Nada de usar camisa social de mangas curtas, calça tradicional e sem charme acima do umbigo ou aquela blusa de malha comprada há umas duas décadas em Jacutinga. Pochete na cintura, então, está proibidíssima. Compre roupas descoladas. Mas atenção: sem exagero. Se você ainda cultiva um barrigão de chope, evite usar aquelas camisetas justíssimas encontradas na Mundo Mix ou na Benedito Calixto.

O calor humano do passado e as brincadeiras são cada vez mais raras. Os jornalistas andam muito estressadinhos e individualistas. Preferem se isolar na baia de trabalho, sua pequena redação particular. Vivemos a ditadura do fone de ouvido. Nem pense em perguntar algo ou fazer uma piadinha com o seu colega ao lado quando ele estiver entretido com seu fone. Ele não vai te ouvir. Se tiver urgência, é mais fácil mandar uma mensagem instantânea.

Saiba que passar muito tempo dentro de uma redação, fazendo entrevistas por telefone e cozinhando releases, é a nova realidade. Não fique deprimido se não puder sair todos os dias para reportagens in loco. O antigo hábito de fazer uma parada estratégica no bar durante a pauta na rua, para uma cachacinha e uma partida de sinuca com o motorista do carro de reportagem, também não existe mais. Aprenda a jogar paciência no computador do jornal, embora seja muito difícil você ter um tempo ocioso para isso.

Seja politicamente correto. Vivemos hoje, inclusive nas redações, a era do politicamente correto! Ou seja, sufoque aquela vontade louca de dar uma cantada na estagiária gostosa. Sabia que só cantar – nem sonhe com sexo selvagem! – já pode ser considerado assédio sexual? Nem pense também em fazer piadinhas com os gays da redação, hein? Respeite as minorias. Hoje, é até bem provável que existam mais gays do que heterossexuais a seu lado.

Procure fazer parte das redes sociais. Isso é muito importante para ser aceito pelos jovens jornalistas da redação. Que tal criar uma conta no Facebook e no Twitter? Faça parte de comunidades virtuais como “Jornalismo 4.0” ou “Adoro ler notícias em portais”. Nada de “Eu amo minha máquina de escrever”, ok? Destaque preferências pessoais como “música eletrônica” e “livros sobre vampiros”. Assim como fazem os jovens, divulgar algumas fotos é uma boa ideia, mas, cuidado, nada de fotos em frente ao espelho, em poses sensuais.


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