Quase nessa mesma altura, um romancista de novelas e de uma biografia de um falsificador de quadros, Clifford Irving, estava a publicar uma biografia do milionário e excêntrico Howard Hughes, garantindo ter a autorização devida para o fazer. Editora: McGraw-Hill. A revista Life, então a perder leitores, comprou os direitos para a sua pré-publicação.
Mas provou-se ser uma fraude. Quase perfeita, envolvendo um outro romancista, que fazia o trabalho de pesquisa, Richard Susskind. Para além dos dois autores, apenas a quinta mulher de Irving e uma antiga namorada deste, Nina van Pallandt, do antigo duo dinamarquês Nina & Frederick, sabiam da falsidade. Irving forjara cartas de Hughes imitando a sua forma de escrever.
Estava-se entre o final de 1971 e o princípio de 1972, quando o próprio Howard Hughes, homem ligado aos media, aviador e excêntrico, desmentiu ter autorizado a escrita do livro. Curioso é que - nota Philip French na sua coluna de cinema na edição de hoje do Observer - nessa semana de Janeiro de 1972 o filme mais visto nos Estados Unidos se chamava Diamonds are forever, em que James Bond visita Las Vegas e protege um milionário que vivia recluso chamado Willard White, claramente inspirado em Hughes.
Clifford Irving foi julgado e preso, a sua mulher igualmente presa na Suíça, por movimentar a conta do dinheiro antecipado pela editora para pagar ao milionário [fotografias de Irving, Hughes e Susskind retiradas do sítio Crime Library].
O filme Golpe quase perfeito tem Richard Gere e Alfred Molina como interpretando os papéis dos dois escritores. Realizado pelo sueco Lasse Hallström, autor de outros filmes como Chocolate e Regras da casa, Golpe quase perfeito é um filme agradável de ver. Isto apesar do próprio Irving declarar que a história é inexacta.
Na história do filme é clara a dupla realidade traçada por Clifford Irving: a realidade propriamente dita e a recriada por si. Esta passava pela gravação de conversas inexistentes e por igualmente inventada violência exercida por colaboradores directos do milionário sobre o escritor.
Um último pormenor também curioso é o da antiga namorada de Irving, a dinamarquesa Nina van Pallandt, ter ganho com a visibilidade do caso. Ela foi convidada para entrar no filme de Altman The long goodbye (1973) e desempenhou o papel de uma das clientes de Richard Gere no filme American gigolo (1980).