Uma exposição actualmente patente no Museu de Arte Moderna Murilo Mendes (Juiz de Fora) deu-me o mote para encontrar exemplos práticos de comunicação, a partir de uma perspectiva antropológica. Da exposição, retive as belas obras do pintor Sílvio Aragão e as histórias em volta destes e de outros quadros.
O caminho velho de ligação das minas ao Rio de Janeiro que serviu para escoamento do ouro deu lugar ao caminho novo (1702-1725), com quase 500 quilómetros. Assim, a potência colonial controlava melhor o tráfego do ouro e outras mercadorias, com postos de fiscalização ao longo do percurso da estrada real. Luiz Bustamante, magistrado que exerceu a função de juiz de fora do Rio de Janeiro (1711-1713), comprou uma sesmaria na margem do rio Paraibuna, época que inicia a história da cidade.
Volvidos os Tempos de Inconfidência, outras pessoas consolidaram e emanciparam o município, como o alemão Henrique Halfeld , que melhorou o caminho novo, a actual avenida Barão de Rio Branco, e Mariano Procópio, responsável pela construção da primeira estrada de macadame, a União e Indústria, de Juiz de Fora a Petropólis. A cidade expandia-se nessas vias de ligação. De ponto de passagem passava a lugar de fixação. Após a febre do ouro e emancipado o Brasil, o café passou a motor de prosperidade da região, transportado pelo trem inaugurado em 1870. Lembremo-nos que Jurgen Habermas, em
Mudança Estrutural da Esfera Pública (1962), analisa o nascimento da opinião pública europeia através da leitura e discussão de jornais em espaços públicos como os cafés, onde se bebia tão delicada e prestigiada bebida.
Logo depois, instalou-se em Juiz de Fora uma fábrica de tecidos, a fábrica dos ingleses, o que levou a chamar-se à cidade a Manchester Mineira. A electricidade viria no final do século XIX e Juiz de Fora alargar-se-ia para o outro lado do rio Paraibuna. Hoje, tem uma prestigiada universidade que já atrai muitos alunos de outros estados da federação graças ao novo Sisu (Sistema de Selecção Unificada): 15,5% conforme notícia do jornal
Tribuna de Minas (2.6.2013).
Uma cidade funciona como uma grande empresa, com sucessivos dirigentes e directores, incorporação de novos produtos e novas estratégias. Podemos aplicar conceitos que pertencem ao marketing mas empregados na comunicação, como cluster (feixe de actividades interdependentes), franchising (franquia, representação) e lobing (associações de classe), sem esquecer a educação, a inovação e o empreendedorismo. Aqui, utilizo empreendedorismo no sentido dado pelo professor Aluizio Trinta (2010: 23) quando aplicado à empresa: projecto, operação comercial, cálculo de riscos, acções afirmativas. Empreendedorismo, continua o mesmo autor, é sinónimo de criatividade empresarial no que tange à organização, à estratégia de comunicação e aos seus públicos. O empreendedorismo exige também cultura. Para Jenkins (2006), nos últimos séculos e no novo mundo (a América latina) misturaram-se tradições de folclore de populações indígenas e de imigrantes e capacidades criativas inovadoras, que passaram de geração para geração.
Já no século XX, essa cultura popular de fusão era quase dissolvida pelos meios de comunicação de massa. Porém, a indústria emergente do entretenimento faz o seu desenvolvimento graças à cultura folclórica. Dito de outro modo: tradição e modernidade tiveram de se entender, mesmo que nem sempre de forma harmoniosa. A escola, os jornais, as tertúlias [bate-papos], a política, o teatro e o cinema aproximaram valores e serviram também como veículos de novidade, fazendo mudar sempre e sempre a estrutura empresarial que é a cidade.
No caso de Juiz de Fora, registo sucessivas actividades como ouro, café, tecidos e universidade, com novos especialistas, profissões, alargamento de instalações e necessidade de comunicar e de estabelecer parcerias e contactos comerciais e políticos. Os edifícios, os textos publicados, as intervenções nos espaços públicos e políticos são formas sempre actuais de comunicar. Retenho conceitos como a visão e a missão dos fundadores e pioneiros, o alojamento como ideia de aculturação (Giles, 2012), a mediação (Harwood e Joyce, 2012) entre interesses diferentes e vontades próprias, a identidade cultural. E penso num conceito a atribuir à comunicação aplicado à sociologia dos espaços: ela é, em simultâneo, ponto de passagem (imagem publicitária, comunicado de imprensa) e de fixação (fábricas e escritórios, identidade e valores culturais).
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OS CAFÉS DE PRAGA Quando li a primeira vez Jürgen Habermas em Mudança estrutural da esfera pública (edição em português de 1984), impressionou-me muito saber da importância dos cafés - entre outros espaços públicos - na formação da opinião...