Boas pessoas
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Boas pessoas


David Lindsay-Abaire nasceu num bairro operário em Boston sul em 1969. Conseguiu uma bolsa de estudos do Boy and Girls Club e iria estudar para a Milton Academy e, depois, as universidades nova-iorquinas de Sarah Lawrence e Julliard. No final da década de 1990 começou a trabalhar como autor dramático e ganhou um Pulitzer para o Teatro (2007).

A peça Boas Pessoas pode ser a obra mais autobiográfica do autor. Daniel (Pedro Laginha) sairia do bairro operário de Boston Sul e estudaria medicina. Depois voltou à cidade mas instalou-se numa zona rica. David Lindsay-Abaire também parece viver uma espécie de emigrante ou estrangeiro - não sendo de Boston ou de Nova Iorque ou de outra cidade onde viva.

Voltar a Boston para ver o bairro e as transformações entretanto ocorridas reflete-se no modo como o autor arquiteta a sua história, em que Margarida (Maria João Abreu), amiga de infância e namorada (dois meses), procura Daniel para pedir emprego. Ela tinha uma filha já adulta, nascida prematura e ainda dependente da mãe. Isso levava Margarida a chegar consecutivamente atrasada ao emprego, até ser despedida através do encarregado Sérgio (Luís Lucas Lopes) da loja de "Tudo a um Euro". A história junta ainda duas personagens que pertencem ao círculo próximo de Margarida: Júlia ou Ju (numa voz portentosa de Sílvia Filipe), amiga íntima, e Dulce (Irene Cruz), senhoria e também confidente da primeira. Só pelas cenas passadas no bingo entre as três mulheres, a que se junta Sérgio, a peça merece ser vista. Há ainda uma longa cena em casa de Daniel, com a mulher deste, Catarina (Leonor Seixas), com a presença de Margarida, convidada para um festa entretanto anulada. Destaco ainda a encenação (Marta Dias), o cenário (Catarina Barros) e os figurinos (Dino Alves), além dos sete coelhos, pela coreografia e pelo desempenho na mudança de cenários.

David Lindsay-Abaire julgava que a sua peça teria um curto período de tempo e que se apagaria rapidamente. Mas a crise financeira relevou as desigualdades sociais e económicas e criou grandes níveis de desemprego nos Estados Unidos, como se verifica também em Portugal, o que mantém uma grande atualidade. Na peça, Daniel não valoriza o fator sorte mas considera que o que lhe aconteceu foi resultado do seu esforço, o que não aconteceu com Margarida. Aqui, faço um novo paralelo entre autor e personagem: só há pouco tempo é que David Lindsay-Abaire descobriu que a bolsa se destinava a premiar um atleta, coisa que ele não era - o que ilustra o fator sorte. Claro que a isto devemos juntar a perseverança dele.

A peça tem momentos sérios, pois trata de problemas sérios, mas a forma como se apresentam os diálogos, o tom irónico colocado em muitas das situações, levam a que a mensagem seja recebida pelo espectador de modo agradável. Afinal, Boas Pessoas leva-nos para o que as pessoas são mas também para os seus discursos. Uma coisa é o que o indivíduo é, outra é o que ele julga ser e o como os outros o veem.

Adenda (em 18 de janeiro de 2016): Sobre a atriz principal e a encenadora, ler aqui artigo do Diário de Notícias.



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