A Rádio Renascença
Coisas e Coisas

A Rádio Renascença


Até meados da década de 1960, dos programas mais escutados de Rádio Renascença destacavam-se Novos Emissores em Marcha, com discos pedidos por correspondência, Enquanto For Bom-Dia, Auditório, Quando o Telefone Toca e Diário do Ar. A programação parecia obedecer cada vez mais a uma grelha comercial. O fundador da estação, Monsenhor Lopes da Cruz, faleceu em 1969. Sucedeu-lhe monsenhor Sezinando Rosa, acompanhado por dr. Tomás Andrade Rocha, padre Américo Brás da Costa e Rogério Leal, com uma nova política de contratação: indivíduos com experiência profissional em rádio, casos do diretor comercial (Albérico Fernandes), da informação (Carlos Cruz) e de programas (padre António Rêgo). A partir de março de 1970, a Renascença passou a emitir 24 horas por dia.

No âmbito das produções independentes, combinando informação e cultura, com algum empenho político-social, surgiram os programas 23ª Hora (1959-1974), Página Um (1968-1975), Tempo Zip (1970-1972) e Limite (1973-1974). Novas áreas temáticas foram o desporto motorizado (1973) e programação religiosa (1968). Dos programas de informação mais escutados, o noticiário 19.Zero-Zero era também vigiado pela censura, pois o recurso a reportagens em direto permitia informação que não passava previamente pela censura. As suspensões de Página Um e Tempo Zip em setembro de 1972 e a liberdade nos noticiários levaram à nomeação de uma comissão de censura nos dias antes de 25 de abril de 1974. A autora do livro, em vez de censura interna, prefere chamar cultura de cautelosa gestão de informação.


O deflagrar do conflito na Renascença a seguir a 25 de abril de 1974 relaciona-se com a proibição de cobertura jornalística da chegada de exilados políticos (Soares, Cunhal). Outra causa foi a leitura de um telegrama de agência noticiosa comunista por Luís Paixão Martins. A greve começou a 30 de abril de 1974. O diretor comercial Albérico Fernandes procurou assegurar a transmissão dos noticiários, mas não conseguiu. A greve acabou à meia-noite de 31 de março e os grevistas impuseram o afastamento do conselho de gerência, a readmissão dos locutores Rui Paulo da Cruz e Rui Pedro e o fim da suspensão dos locutores Adelino Gomes e João Paulo Guerra, decidida em 1972. Um comentário ao ataque palestiniano sobre atletas israelitas na aldeia olímpica de Munique motivara a suspensão dos programas a que os últimos dois estavam ligados. No começo de luta, os trabalhadores eram apolitizados e as suas reivindicações eram laborais. Com o decurso da luta, começou a existir um alinhamento partidário e a relação entre trabalhadores e administração alterou-se.

Depois, houve a tomada da redação por trabalhadores do setor radiofónico, designados por ocupantes, a luta pelo controlo de emissores no Porto e em Lisboa, com repercussão no transmissor da Lousã, uma radicalização crescente das partes envolvidas, culminando na destruição à bomba do emissor da Buraca, a 7 de novembro de 1975.

O livro de Paula Borges Santos faz uma análise muito em pormenor e em profundidade do período marcelista (1968-1974) e da revolução (1974-1975). De ler os capítulos sobre a Igreja Católica, a sua condução e as principais questões colocadas a uma igreja que defrontou sucessivamente um regime ditatorial e uma revolução. Neste segundo período, a própria propriedade da Rádio Renascença pela Igreja Católica chegou a estar em causa. O cardeal D. António Ribeiro emerge como a figura central na resolução adequada.

Leitura: Paula Borges Santos (2005). Igreja Católica, Estado e Sociedade 1968-1975. O Caso Rádio Renascença. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 269 páginas. Prémio Fundação Mário Soares 2004



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