Coisas e Coisas
CIRCULAÇÃO CIRCULAR DA INFORMAÇÃO
Os jornalistas descrevem o mundo com os seus óculos, há uma separação entre pólo intelectual e pólo comercial nos jornais e existe a circulação circular da informação - eis três ideias ou metáforas presentes em Pierre Bourdieu no seu conhecido livro
Sobre a televisão (1997, em edição portuguesa da Celta). Pelo primeiro, ficamos a saber que os jornalistas não olham o mundo tal como ele é, mas dão-nos a informação a partir dos seus conhecimentos, da sua realidade subjectiva. Eles operam uma selecção e uma construção (p. 12). Aliás, isso acontece com qualquer um de nós. O que quer dizer que a
objectividade é um valor muito difícil de alcançar pelo jornalista. Pela segunda ideia, Bourdieu chama a atenção para a passagem de um jornalismo inicial, feito por homens para quem o lucro não era o motor essencial do jornal, para uma actividade comercial, em que a publicidade paga é o elemento principal. O jornalismo é uma actividade económica, como outra qualquer.
Por
circulação circular da informação, uma aparente tautologia, Pierre Bourdieu começa por afirmar que ninguém além dos jornalistas lê tantos jornais (p. 18). É uma espécie de jogos de espelhos que reflectem mutuamente e produzindo um efeito de encerramento. Escreve ele:
"para fazer o programa do jornal televisivo do meio-dia, preciso de ter visto os títulos do das vinte horas da véspera e os diários da manhã, e para fazer os meus títulos do jornal da tarde preciso de ter lido os jornais da manhã" (p. 19). Este é um dos princípios do agendamento, em que uns acabem por se citar aos outros.
A minha alusão à obra do já desaparecido Bourdieu tem a ver com o jornal
A Capital. Com nova direcção e novo layout, o jornal possui uma página de citações de blogues. No passado dia 16, coube a vez de uma mensagem deste blogue merecer a honra de
post do dia, o da véspera, dia 15. Eu intitulara o post
Centros comerciais: comprar com agrado. Tratava-se da leitura de um texto estimulante de Turo-Kimmo Lehtonen e Pasi Mäenpää sobre esse tema.
A Capital transcreveu na íntegra o meu texto e colocou a assinatura do autor, entrando no jogo de espelhos que falava Bourdieu. Ao ler no formato de jornal de papel, os meus olhos dirigiram-se, de imediato, para a coluna do centro, onde aparece escrita a seguinte frase: [...] havia disponibilidade de se disponibilizarem". Nunca na vida deixaria escapar uma repetição de vocábulos ou da mesma raiz, se olhasse para o papel, ou me distanciasse do texto. Isto denota, pois, a rapidez da escrita da mensagem, sem o copy-desk necessário. Por vezes, posso produzir erros de português, por simpatia de teclas próximas, ou esquecer-me de um acento.
Claro que fiquei contente por ver o texto citado no jornal. Mas quero reflectir em dois pontos. O primeiro é o de destacar a facilidade em se preencher uma página. Basta um jornalista procurar nos vinte ou trinta blogues que produzem informação acutilante - segundo os seus critérios jornalísticos de valor-notícia - para ocupar esse espaço vazio, e em pouco tempo de pesquisa. O segundo é a afirmação da importância da blogosfera na pesquisa diária dos jornalistas, a par de outras fontes de informação como as agências noticiosas ou o serviço de agenda.
[O meu obrigado a João Morales e Cristina Ponte que, usando meios de comunicação diferentes, me chamaram a atenção para a página de
A Capital]
loading...
-
Newsmaking - I
Assinalei na sexta-feira, a notícia editada no Público online sobre o Museu da Rádio, assinado por Ana Machado. No jornal em papel, a notícia surgiu no dia seguinte. Na internet, o texto tinha quatro blocos. Na notícia em papel, surgem apenas os...
-
Caso Carrilho (i)
Não li o livro Sob o signo da verdade de Manuel Maria Carrilho nem vi o programa Prós e Contras da RTP. Logo: sobre estas realidades não posso dizer nada. Mas posso destacar as fontes secundárias que li: textos de jornalistas e analistas (artigos...
-
A ERA DOS BLOGUES É o título do texto de José Carlos Abrantes, na sua coluna do provedor do leitor do Diário de Notícias de hoje. Ele parte do tema do dia do mesmo jornal faz amanhã uma semana (e que eu próprio também aqui comentei). Abrantes...
-
"A JORNALISTA EM QUESTÃO"
Anteontem, escrevi sobre os provedores do leitor. E coloquei as seguintes questões no final da mensagem: será que os provedores (também) são parciais? E (mais) permeáveis aos leitores? Quer o provedor José Carlos Abrantes...
-
PRÉMIO DE TELEVISÃO DA APIT
Ontem, durante o seminário de televisão interactiva, promovido pela Ordem dos Engenheiros e pelo Obercom, Susana Gato, secretária-geral da APIT (Associação de Produtores Independentes de Televisão) anunciou o prémio...
Coisas e Coisas