Coisas e Coisas
Jamais trabalharam como jornalista
A presença de jornalistas sem diploma no mercado de trabalho deve ser cada vez maior a partir de agora. É a nova realidade. Por outro lado, existe um grupo de jornalistas – bem grande, por sinal –, que cursou a faculdade, pegou o canudo, mas jamais viveu a profissão na prática. A mudança de rumo deve-se às mais variadas razões e circunstâncias. A seguir, conheça breves histórias de quem estudou para ser, mas nunca foi um jornalista.
No segundo ano da faculdade de jornalismo – sua grande paixão –,
Janaína convenceu-se de que faltava algo à sua futura carreira. Desejava uma formação humana mais completa. Foi quando decidiu fazer, simultaneamente, o curso de História. Passaram-se dois anos, graduou-se em jornalismo, mas a sensação de lacuna em sua carreira permanecia. Prestou, então, vestibular para Ciências Sociais. Acumulou três diplomas e seguia insatisfeita. Partiu para um mestrado e, depois, para um doutorado. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer como é o ar que se respira em uma redação. Semana que vem parte para os Estados Unidos para uma temporada de pesquisa numa universidade. Sua mala já está pronta, com roupas, livros e os vazios de sempre.
O pai insistiu para que
Regina prestasse o vestibular. É importante ter um curso superior, dizia. Poderia ser qualquer um. Será que é apenas para ter uma cela especial quando cometesse um crime?, pensava ela. Optou por jornalismo, profissão chique. Não suportava as aulas de Filosofia e as teorias de comunicação, mas cumpriu sua missão. Após quatro anos, já tinha o diploma nas mãos, para orgulho de seu pai. Na semana seguinte, também com o apoio do pai, abriu uma loja de lingeries em um shopping e hoje é a rainha das calcinhas e dos sutiãs do pedaço. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer como é a neurose do fechamento em uma redação. O principal aprendizado da faculdade foi descobrir que a carta mais importante do truco atende pelo nome de “zap”.
Fernando sempre conciliou a faculdade de jornalismo com a atividade de professor de Inglês. Trabalhava em escolas, dava aulas em sua casa. Com o dinheiro do árduo trabalho, conseguia pagar a faculdade e financiar os deleites sexuais de sua juventude. Ao se formar, não conseguia arrumar um emprego como jornalista. Mas, tudo bem, ele tinha as aulas de Inglês, que sempre o ajudaram. O tempo foi passando, o volume de aulas aumentando e a motivação de ser jornalista diminuindo. Hoje, tem sua própria escola de idiomas. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer o que é uma reunião de pauta na prática.
Célia sempre foi uma menina ansiosa e um pouco medrosa. Desde a adolescência, freqüentava consultórios de psicólogos. Mas a faculdade de jornalismo lhe fazia bem, foi seu melhor remédio. Adorava aquilo tudo e tinha a certeza de que sua carreira seria um sucesso. No último ano do curso, contudo, durante uma atividade prática em sala de aula, seu texto recebeu uma crítica pesada do professor. Entrou em pânico, ficou paralisada. Se não conseguia suportar um revés na faculdade, não teria condições de enfrentar a pressão do dia-a-dia da profissão, refletia. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer o que são os momentos de descontração numa redação, as piadinhas, o riso coletivo. Hoje, trabalha como vendedora de calcinhas e sutiãs na loja de lingeries de uma antiga amiga da faculdade.
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