Futurologia
Coisas e Coisas

Futurologia


Começará o curso de jornalismo aos 17 anos numa universidade pública. Será um dos líderes do centro acadêmico. Se tornará marxista sem saber que isso será uma coisa bem fora de moda. Organizará uma greve de fome fajuta contra a baixa qualidade do ensino. Romperá com Deus. Esquecerá as missas em família da infância, dos sermões do padre Geraldo dizendo que até o pior dos pecadores terá, no dia do juízo final, a chance de se arrepender e alcançar o paraíso. Pecará a torto e a direito, com menininhas devassas no banheiro do centro acadêmico, com os porres na república, com os quadrinhos marginais que devorará. Conseguirá se formar. Dançará com a gravata na testa na noite do baile. Arrumará um emprego de clipador na madrugada. Será repórter de rádio. Editor de imagem numa emissora de televisão. Ganhará uma merreca de salário, mas não trocará a profissão por nada. Conhecerá uma moça bonita com quem dividirá a ilha de edição. Raspará a barba. Romperá com o marxismo. Casará. Terá dois filhos lindos e um cachorro. Passará a ter um apetite danado pelo consumo. Viverá atrás de frilas e mais frilas para dar conta de tantos gastos. Se tornará repórter de TV. Viajará o mundo. A vida será maravilhosa por muito tempo. Sucumbirá a um passaralho. Ficará dois anos desempregado. Quase pirará. Voltará a beber. Voltará a beber muito. Se divorciará. Arrumará um novo trabalho, bem meia-boca. Sobreviverá. Se apaixonará por uma menina de 15 anos que é puta na Augusta. Prometerá tirar a moça daquela vida e lhe dar dois filhos lindos e um cachorro. Será rejeitado pela puta. Ficará puto com a puta. Rasgará o peito da puta com uma faca que roubará de um restaurante decadente. Irá para a cadeia. Brigará por uma cela especial. Dirá que o diploma de jornalista vale alguma coisa, sim! Será esquecido. Ficará fraco. Pegará uma pneumonia. Chegará à beira da morte numa terça-feira, num hospital público, antes mesmo de seu julgamento. Lembrará de Deus. Lembrará das missas em família da infância, do padre Geraldo dizer que até o pior dos pecadores terá, no dia do juízo final, a chance de se arrepender e alcançar o paraíso.

Mas não se arrependerá de porra nenhuma.



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