Rudolf Arnheim publicou o livro
Radio no mesmo ano em que Walter Benjamin divulgou o texto
A Obra de Arte na Era da Reprodutibilidade Técnica - 1936. Ambos judeus, ambos malditos. Arnheim preparara o livro desde finais da década de 1920, interessado na emergência dos novos media (rádio, primeiro, televisão, depois). O gramofone, o telefone, o cinema sonoro e a expansão da imprensa corriam a par da reprodução (fotografia e cinema, tecnologias e meios de expressão trabalhados por Benjamin, que escrevia sobre a perda da aura ou do sentido único da obra pela reprodução que alargava o conhecimento e tornava democrático o acesso às obras). O magnetofone (o gravador de som) estava também a aparecer. Foi igualmente um tempo muito duro, com as ditaduras e o fascismo e o nazismo, que conduziram a um grande desastre na Europa.
Arnheim (1904-2007) começara a sua actividade profissional como jornalista e cronista em jornais e revistas, caso do jornal satírico
Stachelschwein e de
Weltbühne, este um meio ligado à esquerda política e interdito logo em 1933. Arnheim estudara história da arte e escreveu uma tese sobre psicologia da arte dentro da perspectiva da Gestalt. Aliás, a área mais conhecida dele foi essa. Lembro o livro
Arte e Percepção Visual, texto que me deu muito trabalho a ler e trabalhar há mais de vinte anos. Em 1932, Arnheim escrevia
O Filme Enquanto Arte, onde abordou a imagem fílmica. Os seus trabalhos sobre a rádio seguiram muito o raciocínio teórico aplicado ao cinema. No ano seguinte, devido à ascensão de Hitler ao poder, ele abandonou a Alemanha e instalou-se em Roma, onde o editor Ulrico Hoepli lhe encomendou uma enciclopédia do cinema, tarefa não completada devido às leis raciais de Mussolini. Mas foi em Itália que Arnheim escreveu em inglês
Radio (1936), com a tradução italiana em 1937 (
La Radio Cerca la sua Forma) e alemã apenas em 1979. Arnheim, após uma passagem pela Inglaterra, foi viver e trabalhar para os Estados Unidos, onde ensinou na Universidade no Exílio na New York School for Social Research e em universidades como Harvard e Michigan.
Direcção e distância, o ouvido e a sua imagem do mundo, a reverberação, o elogio da cegueira [a rádio não permite ver, ou o audível por supressão do visível], a arte de falar e a sonoplastia são alguns dos tópicos tratados nos capítulos do livro. Arnheim acreditava que a televisão mataria a rádio, do mesmo modo que o cinema mudo fora extinto pelo sonoro. Para ele, a televisão resultaria do casamento do cinema com a rádio, sendo esta a rainha do ouvido, da palavra, da literatura e da música (p. 269). Interessante a perspectiva, com Arnheim a falar em tubos de raios catódicos mesmo no começo da televisão (antes da II Guerra Mundial) - a televisão acabaria com a diferença do teatro, transmitiria filmes e peças de teatro, seria púlpito de conferências e cenário de concerto (p. 262).
A voz, a montagem radiofónica, a ideia de
Hörspiel (peça para ouvir, peça radiofónica) que ultrapassava o teatro radiofónico e se assumia como todo o trabalho da rádio. Ainda não havia o registo magnético e algumas das imagens gráficas do livro dão conta de um tempo em que a emissão radiofónica ainda sentia problemas, caso dos ruídos, mas em que a divulgação universal se fazia. Um exemplo: o Papa transmitia a partir de Rádio Vaticano para todas as nunciaturas do mundo através de ondas curtas (p. 225). Arnheim também dava uma importância muito grande às estações públicas e ao modo como ela podia formar os gostos da população, num sentido pedagógico e popular. Aí, não andava muito longe de Brecht.
Leitura: Rudolf Arnheim (2005).
Radio. Lot: Van Dieren Éditeur
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