Coisas e Coisas


SOBRE OS WEBLOGS - I

A 18 e 19 de Setembro do último ano, decorreu um inesquecível encontro de weblogs, em Braga. Do que me ficou como mais importante foi o reconhecimento deste novo meio de informação como elemento interventor do jornalismo. O que não passa nos jornais ou nas televisões pode passar pelos weblogs, estruturas infinitamente mais leves e que funcionam em redes (tipo passa a palavra). Leia-se: o que não entra politicamente nos media clássicos. Aliás, houve quem lamentasse a ausência dos autores de dois conhecidos blogs políticos, que dariam uma maior animação - e, eventualmente, visibilidade - ao encontro. Porém, creio que as expectativas dos organizadores do encontro seriam atingidas: uma primeira página do Jornal de Notícias e um directo no telejornal da RTP nesse dia 18 de Setembro.

Do que escrevi na altura, retenho o seguinte: "Para José Luis Orihuela, da Universidade de Navarra, a Internet foi o momento mais importante na história da comunicação desde Gutenberg e, na história deste meio, o weblog foi o ponto alto. Para alicerçar tal posição, argumentou com as características activas do weblog - criatividade na e-comunicação (comunicação electrónica), conhecimento partilhado e conversação -, diferente da recepção passiva dos media tradicionais. Orihuela (blog ecuaderno.com) chamou a ainda a atenção para o facto da comunidade dos weblogs ser autoreferencial, com sistemas de rankings e hierarquias, numa prefiguração de fechamento ao exterior" (MediaXXI, Setembro-Outubro de 2003, p. 68).

Jornalistas, antigos jornalistas e professores defenderam a ligação dos weblogs com o jornalismo. Penso em Paulo Querido e Pedro Fonseca. Mas essa também foi a posição de Manuel Pinto e de António Granado. Eu, então, preferi destacar o lado pioneiro da actividade. Comparei os actuais bloggers com os amadores da rádio na década de 1920. Isto é, parece-me haver semelhanças com um movimento ligado aos meios electrónicos de comunicação de há oitenta anos.

Defendi então que "O desenvolvimento das ondas curtas [rádio] ocorreu no período a seguir à I Guerra Mundial, quando os soldados americanos regressaram da frente europeia, onde tinham praticado a transmissão de rádio. Passados à vida activa, construíram aparelhos com materiais baratos, usando gamas de frequências rejeitadas pelo Estado e pelas forças económicas. Num movimento livre, descobriram que a voz chegava facilmente ao outro extremo do mundo. Experimentação e inovação constantes detectam-se também no movimento dos weblogs. Memórias, análises ou críticas são características destes diários. Como na rádio, também as mensagens do weblog chegam a qualquer parte do mundo. A que se junta a liberdade estética, cultural, social e política, como alternativa à internet. De igual modo que a rádio experimental, o weblog é um meio electrónico de comunicação que poderia chegar à massificação mas – na minha leitura – permanecerá como movimento de especialistas e cultores de um género. Primeiro, porque é uma ferramenta de início de actividade, com rápidas transformações tecnológicas e ajustamento do objecto de trabalho. Depois, porque se especializa – um diário de literatura tende a não se misturar com o de análise política, de jornalismo ou de outro género. Com isso, instauram-se áreas independentes, de círculos".

Nessa comunicação, mostrei que também há "diferenças. Dada a escassez de meios (poucas frequências disponíveis) e o facto de as emissões se concentrarem à noite, a sobreposição de vozes na rádio gerou interferências. As associações de radioamadores criadas restabeleceram os protocolos de qualidade no acesso. Nos weblogs – como em toda a arquitectura da internet – não há essa carência. O acesso faz-se assincronamente, quando e onde se quiser. Já não há um tempo/espaço preciso para o contacto. A virtualidade na difusão e acesso criou um elemento específico e aparentemente oposto à ausência do espaço/tempo: a existência do arquivo para preservação da memória. Por outro lado, o aleatório na sequência de vozes na rádio tem a sua correspondência nas hiperligações que se estabelecem em cada weblog. Isto é: não há uma previsão de quem fala a seguir num canal de radioamadores. Do mesmo modo, um texto de weblog pode conduzir para um ou vários outros textos, criando a circularidade do conhecimento. Uma outra distinção existente nos dois movimentos é o emprego dos sentidos sensoriais. A rádio de ondas curtas tem apenas sons. Mas o teatro radiofónico criou a captação de sons ambientais, que nos dão a “ver” a realidade. Estamos na passagem para a galáxia Marconi, como preconizou McLuhan, numa retoma da multiplicidade sensorial. Ao sentido sonoro juntar-se-á o visual na televisão. A internet vai mais longe ao incluir a interactividade. O weblog contém essa característica, com a escrita de comentários no próprio post ou troca de mensagens para o e-mail do responsável do weblog. A interactividade é um elemento imprescindível na comunicação e na pedagogia".

E concluia que, "Ao comparar dois meios de comunicação, procurei demonstrar que, em tempos históricos variados, há movimentos que repetem estruturas, embora apoiados por tecnologias ou visões culturais e políticas diferentes".



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