Coisas e Coisas
DEZ ANOS DE HISTÓRIA DA SIC (1992-2002). O QUE MUDOU NO PANORAMA AUDIOVISUAL PORTUGUÊS - III PARTE
[Texto inicialmente publicado na revista
Observatório, nº 6, de Novembro de 2002, e aqui reproduzido com pequenas alterações em mensagens já colocadas (29 de Abril e 3 de Maio)]
Novo ciclo na vida da SIC: projectos e parcerias
Canais temáticos, como a criação de um canal de notícias, entrada na informação electrónica (internet) e aquisição de empresas de produção de conteúdos fizeram parte do novo ciclo de vida do canal de televisão. Entrava-se na fase dos novos projectos e parcerias (1999-2001), que sucedia aos períodos de afirmação do projecto (1992) e liderança no mercado (1995-1998).
O investimento publicitário em todo o sector de televisão foi de 226 milhões de euros em 1994, subindo para 422 milhões em 2000 (SIC, Relatórios de Gestão Referentes aos Exercícios). Já em termos de receitas brutas, em 1995, a SIC arrecadou 111.885 milhões de euros, ao passo que a RTP recebia 101.560 milhões e a TVI 28.210 milhões de euros. Em 1999, a SIC subia para 200.730 milhões de euros, a RTP passava a 109.375 milhões e a TVI ficava em 67.290 milhões (SIC). Mas começava uma inversão lenta na relação entre os canais. Para a SIC, o ano de 1999 foi de perda de audiência, acentuada em 2000 e 2001. Também as receitas provenientes da publicidade baixariam desde 1999. A TVI passava a ser o
challenger. Se o Big Brother foi o centro das atenções, ao provocar escândalo mas garantir a fidelização dos telespectadores, a produção nacional (telenovelas) e a tabloidização das notícias tiveram a primazia na TVI. Vale a pena procurar perceber o fenómeno que fez perder a liderança à SIC. Entrava-se numa cultura que associava o espectáculo a um modelo
voyeurista e exibicionista (Bastos et al., 2001: 12). A “novela da vida real”, como dizia a promoção do programa, permitia ao telespectador saber o que se passava, minuto a minuto, da vida íntima de algumas pessoas isoladas do mundo externo. Havia ainda o aspecto do
peep-show e confessionário, janela ou orifício que permitia aos concorrentes o acesso ao exterior, para falar com a apresentadora do programa, recobrindo aquilo a que Rui Cádima designa por
televerdade: a câmara escondida ou qualquer efeito simulador do real guiam-nos para uma dimensão da curiosidade (Cádima, 1996: 72).
A contra-programação da SIC seria constituída, bastante tempo depois, pelos programas
Acorrentados e
Bar da TV, de sucesso duvidoso. Perdia-se a estratégia da programação popular, as audiências baixavam e o mal-estar instalou-se na estação de televisão. As dissensões aumentaram, o que levou Emídio Rangel a perder o controlo da situação, em confronto nomeadamente com Nuno Santos, director da SIC Notícias, e, mais tarde, a abandonar a SIC (Setembro de 2001), por troca com a RTP.
Após a recomposição directiva da SIC e subsequente alteração estratégica, o
Masterplan fez parte enquanto programa central na recuperação das audiências para a SIC, já enquadrado neste texto como pertencendo ao quarto período, o da retoma. Uma análise às capas das revistas cor-de-rosa, a partir de Fevereiro de 2000, onde são frequentes as alusões aos “heróis” do reality-show, com fotografias de página inteira e revelação das suas emoções, demonstra a importância da imprensa na promoção de um produto televisivo.
Além do referido reality-show, a produção nacional, as telenovelas brasileiras, os filmes e os programas de entretenimento, a par dos acontecimentos programados ou imprevistos, marcaram este terceiro período de vida da SIC (1999-2001). Da produção portuguesa destacaram-se
Médico de Família,
Os Malucos do Riso,
Mundo VIP,
Ponto de Encontro e
Chuva de Estrelas. Júlia Pinheiro animava o programa da manhã (
SIC 10 Horas), horário que o canal privado pretendia competir com a RTP. Um programa inédito sobre música clássica juntou António Vitorino d’Almeida e Bárbara Guimarães, os
Duetos imprevistos. A vinda de Xanana Gusmão a Portugal, a morte de Amália Rodrigues (Outubro de 1999), a escolha de Portugal para organizar o Euro 2004, o Carnaval brasileiro em directo e o congresso do PSD (Fevereiro de 1999) foram alguns dos principais acontecimentos que mereceram destaque no canal privado. No campo da informação, o
Jornal da Noite continuava a ser o bloco preferido dos telespectadores portugueses, com uma média diária de 1,67 milhões de telespectadores (18,7% de audiência) em 1999.
A SIC alargava as suas áreas de negócio. Assim, na venda de programas, a SIC colocou as séries documentais
Salazar e
A Grande Viagem no Canal História e a série
Médico de Família nas televisões de Cabo Verde e de Angola, em 1999. A transmissão de vários jogos de futebol foi também feita para estas duas estações televisivas. A SIC também promoveu peças de teatro, caso do
Rei Lear, de Shakespeare, no teatro D. Maria II, em 1998. Nesse ano, publicitou ainda a Feira do Livro, êxito que repetiu em anos seguintes, com especial relevo para a edição de 2002.
Em 2000, dava-se a grande transferência do entertainer Herman José da RTP para a SIC, depois de uma ligação de cerca de vinte anos ao canal público. Naquela altura, os jornais escreveram que desaparecia a última glória da coroa da RTP.
[continua]
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