Coisas e Coisas
A QUEM INTERESSA A RTPN?
Os jornais de ontem, dia 25, fizeram referência ao canal que substitui a NTV. Chama-se RTPN [o
N quer dizer Nacional! Também existe a Orquestra Nacional do Porto!], e vai começar a emitir a partir da próxima segunda-feira. Segundo o
Público, o director de programas José Rodrigues dos Santos terá afirmado: “Mais do que uma mudança de nome, imagem e de grelha, o que vai nascer na próxima segunda-feira é um novo canal da RTP”. À frente, a notícia diz que haverá uma “exportação” de programas entre os canais (RTP1, 2: e RTPi). Já o
Diário de Notícias realça a aposta do novo canal a emitir do Porto na informação (que ocupará mais de 50% de espaço na grelha). Irónico, contudo, é o que diz o
Público: “a administração está a convidar pivots a transferirem-se para a capital”.
Os dois jornais fazem alusão a programas âncora: o 4 X Ciência (uma das jóias da coroa, escreve o jornalista do
Diário de Notícias) e a Hora de Baco. Mas também música, culinária, roteiro cultural, moda, desportos radicais. E o
Público dá conta do orçamento: cerca de três milhões de euros. Barato, porque a maior parte dos conteúdos é de produtoras externas.
Confesso que fico sem saber a verdade: um novo canal? Mas de quê, se até os jornalistas e animadores (presumo que pivot seja a palavra que queira dizer isto) estão a ser convidados a trocarem o Porto por Lisboa? Também não percebi a história das negociações difíceis com a TV Cabo: será para dizer à SIC Notícias, por terceiros, que chegou a concorrência no cabo? Provavelmente, andamos todos a enganarmo-nos uns aos outros, como o conto de Hans Christian Andersen, que narrava a história do rei nu, mas que ninguém ousava dizê-lo. Não se passa de uma situação de ruptura eminente (e do anunciado desmantelamento da RTP, de há dois anos) para a de uma grande fartura de canais e com intenções de crescimentos de quase 100%, como a subida do share de 0,9% para os 1,7% da RTPN, presente nos discursos da cerimónia passados aos jornais. Por exemplo, o projecto da 2: ainda não encontrou o caminho ideal. Pelo menos, foi o que depreendi da notícia sobre um debate ocorrido na última quinta-feira, organizado pelo CIMJ, a que não pude assistir.
Há dias, li um notável editorial no jornal
Público. Partindo de um outro exemplo (lamentável pelo seu enquadramento no tecido empresarial e empregador do Porto), o jornalista Manuel Carvalho comentava a aquisição total do canal NTV pela RTP. E concluía que este negócio fora uma grande perda para o Porto. A cidade viu desvanecer-se a hipótese de criar a fileira das indústrias culturais (audiovisual, escrevia o jornalista). Isto é: criar empregos para jornalistas, artistas, produtoras, argumentistas, catering, carpintaria, sonoplastia, marcas e nova imagem da cidade, ligações à Câmara do Porto e outras autarquias, aos capitais financeiros de empresas e empresários da região, ao cinema, ao vídeo, à rádio, às universidades, sei lá que mais. O Porto até tem várias e boas escolas de arte e de teatro, por exemplo. E paisagens exteriores de inolvidável beleza. Claro que seria difícil a equivalência, mas poderia aproximar-se da relação entre Madrid e Barcelona (cultura) ou entre Rio de Janeiro e S. Paulo (telenovelas). Por haver concentração geográfica empresarial, por oposição a descentralização, isso não quer dizer maiores ganhos de produtividade nem maiores projectos.
[razão sentimental grande: vivo em Lisboa, perto da praça de touros do Campo Pequeno, cujo restauro a está a pôr lindíssima, até parece ter minaretes como as igrejas de Moscovo, venham admirar, se fazem favor, mas vi as primeiras e inesquecíveis imagens de televisão no Porto, com as Lassies, os Rintintim, os Bonanzas e... as touradas do Campo Pequeno. Provavelmente Paz dos Reis, o primeiro cineasta do país, se ainda fosse vivo, partilharia igual mágoa face à desconsideração pela sua cidade]
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