Coisas e Coisas


ESPELHO MEU

É o título da exposição patente no CCB sobre Portugal visto pelos fotógrafos da Magnum. Lê-se: "Em 2001, ao percorrer os arquivos da Magnum, encontrámos mais de 1000 imagens sobre Portugal, a maioria das quais nunca tinha sido objecto de qualquer mostra ou publicação".



Percorre-se a exposição com um frémito de reconhecer a História através de fotografias avulsas relativamente aos acontecimentos mais marcantes. Sem contudo os ver todos, no fundo das imagens descobrimos um país que mudou muito desde os anos 1950 até hoje. Onde havia ordem reprimida (visível no vestuário, no olhar desconfiado mas em simultâneo subserviente perante a câmara) há variedade (o casamento de ciganos, com as raparigas "produzidas" para a cerimónia, decotadas e de olhos pintados, certamente a cheirarem bem, por oposição à cena de casamento popular em 1964, em que os noivos parecem tristes e arrependidos, e ainda não sairam da mesa da boda, foto feita por Thomas Hoepker). Henri Cartier-Bresson, das muitas imagens que já foi possível ver dele, deixa-nos uma fotografia de 1955, tirada em Viana do Castelo.

Num televisor, passa um filme sobre a reforma agrária, onde se conta a história de franceses que vieram em excursão ver o que se passava nesse ano de 1975. Logo numa das fotografias não muito distantes do televisor, vêem-se jovens descendo a rua no pós-25 de Abril de 1974. Eles parecem-me quase anões e, se não estivesse indicado na legenda da fotografia, parecia-me não uma manifestação urbana mas rural, sinal de que, afinal, não mudámos tanto como escrevi acima. Para além de uma curiosa procissão no meio da praia, juntando crentes e veraneantes, a actualidade remete-nos para a Cova da Moura e para a segunda ou terceira geração de cabo-verdianos, fotografados por Susan Meiselas.

No desdobrável da exposição, cujas comissárias são Alexandra Fonseca Pinto e Andréa Holzherr (da Magnum Photos Paris), lê-se que "o rapaz da Mocidade Portuguesa [imagem de Thomas Hoepker] tinha sido substituida por mulheres de lenço na cabeça e punho erguido". Há uma imagem curiosa de Guy Le Querrec, a de reunião de pescadores, cujo local de encontro foi o pavilhão escolar local, todos juntos a um cesto de basquetebol, como se estivessem discutindo se a bola tinha ou não entrado.

Na retina, ficou-me a imagem de Josef Koudelka, em Braga, o ano passado. Vê-se uma ramada de videira, em que esta cresce da esquerda para a direita. Os pilares de granito que suportam a estrutura estão levemente inclinados; a árvore está a "rebentar", o que significa Primavera. A neblina que se vislumbra do lado esquerdo recorda o ar calmo e fresco das manhãs. Sem saber porquê, lembrei-me do filme A guerra dos mundos, de Spielberg, quando os invasores extra-terrestres acabam com a pasmaceira do dia a dia das populações e deitam-se a destruir tudo que vêm à frente. Certamente, porque as imagens do filme ainda estão muito presentes em mim, pois não se vislumbram semelhanças.

A não ser a comparação das paisagens ainda rurais das fotografias de Josef Koudelka com a falta de conservação dos edifícios das nossas cidades (imagens que fiz nas duas últimas semanas em Lisboa e Porto).

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