Coisas e Coisas
EXPRESSOHá três ou quatro anos atrás, eu tinha a vontade de escrever uma história do semanário
Expresso, dada a importância do jornal na vida democrática do país. Ainda esbocei as linhas gerais dessa intenção que incluíam o seguinte: 1) génese do jornal (1973), revolução (1974), esquerdização do regime e nacionalizações da imprensa (1975), "normalização", censura versus liberdade de imprensa, 2) a revista e o jornal
broadsheet, dois jornais num só (1980), 2º caderno, cartaz, "Vidas" (agora "Única"), guia da semana, 3) época de apogeu dos semanários (
O Jornal,
O Tempo,
O Semanário) e consolidação do
Expresso (anos 80), 4) institucionalização do jornal nos seus 25 anos (1998), sinergias do grupo de informação - jornais e televisão (SIC).
Como metodologias de investigação prevista, incluía pesquisa documental em arquivos (
Expresso, Mário Soares, Torre do Tombo), entrevistas com directores, editores e jornalistas, e análise de conteúdo (à primeira e última página do primeiro caderno, 1300 edições, e à revista). Como obras teóricas de referência seguiria Michael Schudson (1978,
Discovering the news - a social history of American newspapers) e Jeremy Tunstall (ed., 2001,
Media occupations and professions - a reader).
O livro do arqº José António Saraiva (2003,
Confissões de um director de jornal) e outras contingências da vida levaram-me a esquecer totalmente essa ideia. O livro do ainda director do
Expresso contém muita informação útil, embora ele deva ser lido com atenção como qualquer outro livro de memórias: destacam-se uns acontecimentos, ignoram-se outros. E qual o equilíbrio entre isto? E, por outro lado, um livro de memórias é sempre a justificação de medidas tomadas e de ajustes de contas, como aparece com alguma frequência no livro.
Agora, recuperei alguns recortes de imprensa sobre o tema para os voltar a arrumar. Deles, menciono uma peça escrita por Sofia Rodrigues (
Público, 6 de Janeiro de 2003), ocasião dos 30 anos do semanário. No primeiro número do Expresso, a 6 de Janeiro de 1973, a manchete era "63 por cento dos portugueses nunca votaram". O jornal custava cinco escudos (€0,025;
a inflacção que houve depois!) e os princípios evocados no estatuto editorial pelo seu director, Francisco Pinto Balsemão, eram: seriedade, rigor e independência. De cariz liberal, prossegue a mesma notícia, o
Expresso inspirava-se nos
sundays ingleses.
Dos outros dois recortes que guardo numa capa de plástico, o primeiro é do próprio director José António Saraiva, por ocasião do aniversário do jornal há dois anos e meio (
Expresso, 11 de Janeiro de 2003). Escreve ele: "A minha primeira impressão, quando aqui cheguei, foi de que tinha entrado num manicómio. A transição do «atelier» [ele é arquitecto] - onde funcionava como eremita - para a redacção do
Expresso foi um choque brutal. O ambiente de um jornal, com a febre das notícias e a competição interna, leva as pessoas a revelarem mais abertamente a sua natureza". Nessa coluna, "Política à portuguesa", que ele mantém desde há mais de 25 anos (ou desde o começo do jornal, não investiguei), ele apura o modo como começou a exercer o seu ofício de director: "O ambiente era estimulante mas simultaneamente duro e a questão do poder não estava resolvida. Havia regularmente plenários de redacção onde se faziam ajustes de contas e se exigiam cabeças". O arquitecto tratou da "normalização", reorganizando o primeiro caderno, e via Vicente Jorge Silva a lançar a "Revista", com "novos temas e inquietações".
É exactamente uma entrevista com Vicente Jorge Silva que termino esta ronda pelos meu
clipping [entrevista publicada no
Expresso em 10 de Fevereiro de 2001]. Da revista recorda ele: "A «Revista» do
Expresso foi muito importante para mim nessa altura. Foi um trabalho feito com o António Mega Ferreira, que é uma pessoa muito estimulante, muito criativa. O conceito de «Revista» era inovador para a altura, não se baseava em modelo nenhum existente". Antes de ingressar no Expresso, Vicente Jorge Silva estivera no
Comércio do Funchal, o jornal cor-de-rosa antes de 1974, nitidamente contra o regime de então. Depois do
Expresso, seria um dos fundadores do
Público e seu primeiro director, para quem o jornal "abriu uma janela, deixou entrar ar fresco na imprensa portuguesa".
Ora aqui está um bom tema de investigação: como evoluiram os jornais entre 1970/1974 e os finais do século? Que mercado, que problemáticas, que profissionais, que transformações tecnológicas? Qual o peso do Expresso em todas essas mudanças? Como conseguiu resistir aos tempos e tornar-se um jornal imprescindível, mesmo que digamos "vou deixar de o ler, pois só traz balões de ensaio" [notícias verdadeiras com tópicos inverosímeis destinados a apenas um determinado grupo de pessoas, para exercício de pressão]? O café da manhã de sábado sem ser acompanhado pela leitura do
Expresso é amargo, é queimado, é aguado, não presta [aliás, um bom café de máquina é designado habitualmente por
expresso, embora não me parece haver razão para sobreposição]!
loading...
-
Memórias Dos Media
O pai de José Jorge Letria morreu quando ele tinha 16 anos. Prometeu à mãe dar menos atenção às guitarras e preparar-se para o curso de direito. Andou pela Faculdade, mas a música foi mais forte e enveredou por uma carreira que o levou a Paris...
-
As Contas Do Expresso
De acordo com o relatório e contas de 2007 do Expresso (publicado hoje no caderno 2), o jornal teve um aumento de 5% de receitas publicitárias relativamente a 2006. O crescimento foi mais notório no caderno 1: 21%. Já em termos de receitas nas vendas...
-
15 Anos Da Sic
Faz hoje 15 anos que a SIC começou a emitir. Era o começo da televisão privada em Portugal. O Expresso de ontem entrevistou duas caras conhecidas do canal: Rodrigo Guedes de Carvalho e Bárbara Guimarães. O Público de hoje faz um balanço com o...
-
OS 42,2% DO EXPRESSO "Enquanto que o preço [de capa] deve pagar o papel, a impressão e a distribuição, a publicidade pagará a redacção e a administração e fornecerá o lucro do jornal" (Émile de Girardin, fundador do jornal La Gazette em 1836,...
-
LEITURAS DE HOJE EM FORMA DE TELEGRAMA 1) José António Lima sai do Expresso. O esperado era que ele acompanhasse José António Saraiva em novas funções (abandonando a de director-adjunto, que ainda ostenta na edição de hoje). Sairá do jornal porque...
Coisas e Coisas