Coisas e Coisas
Violência na mídia e os efeitos sobre as crianças
Praticamente
desde a invenção da televisão, pais, professores, legisladores e profissionais
de saúde mental se preocupam com o conteúdo dos programas de TV e seu impacto,
especialmente nas crianças. Albert Bandura, pesquisador que trabalha com
aprendizado social e a tendência das crianças a imitarem o que veem, deu
especial atenção ao assunto de como a violência é retratada nessa
mídia.
Como resultado de 15 anos de pesquisas sobre o impacto de
programas violentos sobre as crianças, foi criado, em 1969, um comitê científico
para analisar assuntos relacionando à televisão e comportamento social (o Surgeon General’s Scientific Advisory Committee on Television
and Social Behavior). A comissão analisou as respostas da violência a
partir das mudanças de atitudes, valores e comportamento dos telespectadores. Um
relatório feito em 1982, com base nos dados colhidos por esse comitê, resultou
em um trabalho feito pelo Instituto Americano de Saúde Mental, em que foram
identificados os principais efeitos da exposição à violência televisionada nas
crianças:
• Elas podem ficar menos sensíveis à dor e ao sofrimento
alheio
• Pode haver aumento do sentimento de medo relacionado ao
mundo ao seu entorno
• É possível que a agressividade e comportamentos violentos
para com outros indivíduos aumentem.
Pesquisas feitas por especialistas como Rowell Huesmann,
Leonard Eron e outros, apontaram que crianças, nos primeiros anos de escola, que
ficam expostas a muitas horas de violência na TV, têm maior tendência a
comportamentos agressivos durante a adolescência.
Ao observar esses mesmos indivíduos na idade adulta,
Huesmann e Eron chegaram à conclusão de que aqueles que haviam sido expostos –
na idade de 8 anos – a muitas horas de programas televisivos violentos, tinham
mais problemas com infração de leis e violência. Entretanto, comportamentos
agressivos na infância não tinham relação com maior interesse por programas
televisivos violentos na adolescência. Essa última constatação aponta no sentido
de que assistir à televisão tem relações com a violência quando essas crianças
se tornam mais velhas, mas a agressividade na infância não necessariamente
resulta em indivíduos agressivos.
Mais recentemente, os videogames se tornaram um fenômeno
mundial. Entretanto, há poucos estudos efetivos sobre o assunto. Um desses
estudos, feito por Craig Anderson e uma equipe de pesquisadores, mostrou que
jogos violentos podem aumentar os pensamentos, sentimentos e comportamentos
agressivos de um determinado indivíduo. Essa tendência foi observada tanto em
experimentos de laboratório como na vida cotidiana desses indivíduos que
participaram da pesquisa.
Outro estudo, feito anteriormente por Anderson, apontou que
os videogames violentos podem ser mais impactantes do que programas televisivos
ou filmes violentos, pois há o elemento da interatividade envolvido, o que faz
que o jogador se identifique com o agressor.
Anderson e outros pesquisadores também estão focando
pesquisas sobre como letras de música envolvendo palavras relacionadas à
violência podem afetar o comportamento de adultos e crianças. Em um desses
estudos, feito em 2003, e que partiu de dados colhidos entre estudantes do
ensino médio americano, Anderson observou que músicas com letras violentas
aumentavam pensamentos e emoções agressivos e que havia uma relação direta com o
tipo de música ouvida.
“Uma conclusão importante dessa e de outras pesquisas sobre
entretenimento midiático é que os temas apresentados aos consumidores resultam
em determinadas respostas”, diz Anderson. “Essa mensagem é importante para todos
aqueles que consomem esse tipo de entretenimento, mas especialmente para os pais
de crianças e adolescentes.”
Significância
Uma pesquisa feita nos EUA mostra que uma típica criança
americana assiste a aproximadamente 28 horas de televisão por semana (4 horas
por dia) e, portanto, já assistiu por volta de 8 mil assassinatos quando atinge
os 11 anos de idade. E mais: a maioria dos assassinos representados na TV
consegue se safar da responsabilidade pelos seus atos em 75% dos casos, ao mesmo
tempo em que não mostram qualquer remorso ou arrependimento moral pelo ocorrido.
Dessa forma, a socialização televisiva da violência pode fazer que essas
crianças fiquem imunes à brutalidade e à agressividade, enquanto outras podem
ter mais sentimentos de medo relacionando o perigo à vivência social.
Com as pesquisas claramente apontando que programas
televisivos violentos podem levar a comportamentos agressivos, a Associação
Americana de Psicologia (APA) distribuiu, em 1985, uma série de diretrizes
informando às produtoras de TV e ao público em geral sobre o potencial perigo da
exposição de crianças à violência na televisão.
Em 1992, um Comitê sobre Televisão e Sociedade da APA
publicou um relatório que confirmava a relação entre violência televisiva e
agressividade.
Aplicação prática
Em 1990, o Congresso americano aprovou uma lei que regulava
a veiculação de programas televisivos violentos (o chamado CTA). Como resultado
desse CTA (modificado em 1996) foi sugerido às redes de televisão que ao menos
três horas de sua programação tivessem um viés educacional e informacional,
focando as necessidades intelectuais e cognitivas (incluindo emocionais e
sociais) de crianças menores de 16 anos. Esses programas ganhariam indicação
clara e objetiva sobre seus objetivos educacionais.
Tais programas educacionais, geralmente, contêm mensagens
diretas e indiretas sobre temas relativos à cooperação e à compaixão em vez de
agressividade. Pais agora podem ter opção na hora de escolher o que seus filhos
podem assistir na TV. Pesquisas sobre televisão e violência também levaram ao
desenvolvimento de sistemas que permitem aos pais fazer uma leitura e julgamento
claro sobre o conteúdo dos programas televisivos antes de permitirem que seus
filhos assistam ao que passa na TV.
Paralelamente aos avisos dos efeitos negativos da violência
no conteúdo midiático, as pesquisas em psicologia têm um amplo histórico de
cooperação para produção de conteúdos televisivos de qualidade. Daniel Anderson,
pesquisador da área de psicologia da Universidade de Massachusetts, nos EUA, por
exemplo, tem estudos que auxiliaram no desenvolvimento de conteúdos para
programas como a Vila Sésamo, que têm viés claramente educativo.
Bibliografia original
Anderson, C. A., Carnagey, N. L. &
Eubanks, J. (2003). Exposure to violent media: The effects of songs with violent
lyrics on aggressive thoughts and feelings. Journal of Personality and Social
Psychology, Vol. 84, No. 5.
Anderson, C. A., & Dill, K. E.
(2000). Video games and aggressive thoughts, feelings, and behavior in the
laboratory and in life. Journal of Personality and Social Psychology, Vol. 78,
No. 4.
Huesmann, L. R., & Eron, L. D.
(1986). Television and the aggressive child: A cross-national comparison.
Hillsdale, NJ: Erlbaum.
Huesmann, L. R., Moise-Titus, J.,
Podolski, C. L., & Eron, L. D. (2003). Longitudinal relations between
children’s exposure to TV violence and their aggressive and violent behavior in
young adulthood: 1977-1992. Developmental Psychology, Vol. 39, No. 2, pp.
201-221.
Huston, A. C., Donnerstein, E.,
Fairchild, H., Feshbach, N. D., Katz, P. A., Murray, J. P., Rubinstein, E. A.,
Wilcox, B. & Zuckerman, D. (1992). Big World, Small Screen: The Role of
Television in American Society. Lincoln, NE: University of Nebraska
Press.
Murray, J. P. (1973). Television and
violence: Implications of the Surgeon General’s research program. American
Psychologist, Vol. 28, pp. 472-478.
National Institute of Mental Health
(1982). Television and Behavior: Ten Years of Scientific Progress and
Implications for the Eighties, Vol. 1. Rockville, MD: U.S. Department of Health
and Human Services.
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