O espaço em que se passa a ação está intimamente ligado ao modo como algumas obras foram escritas. Por exemplo, não é por acaso que o título da obra-prima de Guimarães Rosa leva em conta a geografia de seu romance: "Grande Sertão: Veredas". Ler a obra sem saber nada sobre o sertão de Guimarães Rosa é perder a maior parte do romance. Isso porque o romance é composto de dualidades (a linguagem entre erudita e popular, a sexualidade de Diadorim, o bem e o mal em Riobaldo, etc.) e o sertão é a peça principal para fixar esses contrastes. O sertão de Rosa possui leis específicas que moldam os personagens e a aridez do lugar é transportada para a linguagem do narrador ou como ele diz é "onde o pensamento da gente se forma mais forte que o poder do lugar".
Outro exemplo na literatura nacional da utilização do cenário para moldar um romance é a obra "Vidas Secas" de Graciliano Ramos. Os ciclos da seca nordestina são reproduzidos na forma como são ordenados os capítulos e novamente a linguagem curta, direta e seca tenta aproximar o leitor da paisagem da caatinga. Daí, quando Fabiano – o sertanejo que foge da seca – se confronta com elementos da cidade sua incompreensão é reproduzida em sua incapacidade de domínio da linguagem, sendo ludibriado por seu patrão e agredido por um soldado, tornando a relação campo versus cidade um ponto fundamental na obra.
Agora imagine um leitor estrangeiro, que não possua nenhuma referência sobre o Brasil e sua geografia. Provavelmente sua compreensão das duas obras será limitada e todas essas adaptações realizadas para tornar o cenário refletido na linguagem não terão nenhuma importância para ele. Pode ser que se concentre apenas em dizer se a história é boa ou ruim, se diverte ou emociona, ou se os personagens são bem ou mal construídos. Mas perceba que uma avaliação desse tipo será parcial ou até incorreta por falta de informações. O leitor poderá, por exemplo, dizer que o narrador de Rosa é inverossímil, pois ninguém fala daquele modo.