Memória: ficção ou realidade?
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Memória: ficção ou realidade?


Não consigo entender como alguém pode dizer que é fã de Marcel Proust e sua obra "Em Busca do Tempo Perdido" e ainda assim afirmar que não conhece as memórias de Pedro Nava. Algumas pessoas, quando questiono a respeito, simplesmente respondem que ambos têm alguma semelhança mas que Proust escreve ficção e Nava memórias. Ora essa e daí? O problema, em minha opinião, não é se um escreve ficção e o outro não. O problema é Proust ser conhecido e reverenciado no mundo inteiro e Nava não ser lido por quase nenhum brasileiro. O desconhecimento da obra de Nava faz com que muitos não consigam perceber suas semelhanças. Proust apanha no ar meros detalhes e os transforma em sinapses para a volta ao passado. Relembra e revê detalhes com uma poesia magnífica. Mas é tudo ficção. Memórias de ficção. Nava pega suas próprias memórias e as transforma, contando-as de um modo encantador, que nos atrai o tempo todo. Parece até ficção, mas são memórias. Nava e Proust, portanto, são bem semelhantes e o que os diferencia é um mero detalhe: em um a ficção é misturada às memórias e em outro ocorre o contrário. Mas talento os dois têm de sobra.

Proust e Nava contam histórias familiares, destacam costumes, mentalidades, vestuários e hábitos, além de pensamentos filosóficos e políticos. Lendo a obra dos dois autores conhecemos a intimidade de duas sociedades aristocráticas distantes geograficamente, mas se vistas de perto, estão bem próximas. Pode-se afirmar que os personagens da obra de Marcel Proust se lessem as memórias de Pedro Nava se identificariam em muitos aspectos. Vamos pensar assim, pois acredito que alguns personagens de Nava leram Proust e se identificaram em muitos aspectos. Drummond, por exemplo, não só leu como traduziu parte de sua obra. Enfim, Nava era um grande fã de Proust e certamente sua obra foi influenciada pelo autor.

Por isso, recomendo o exercício aos fãs de Proust: leiam todos os volumes das memórias de Nava. Percebam como ficção e realidade são conceitos bem voláteis na literatura. Em alguns casos, Nava ao contar um fato, transforma-o por distorcê-lo ao ponto de se aproximar da ficção. E Proust, como grande contador de histórias, cria uma ficção tão próxima da realidade que até nos esquecemos de diferenciar os dois. E esqueçam os conceitos de realidade e ficção ao lerem ambas as obras. O que importa mesmo não é se o fato ocorreu ou não na vida do autor e sim como somos levados nessa viagem ao passado.



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