A servidora pública Silvana*, 47 anos, começou a desconfiar do comportamento
da filha Patrícia*, 14, quando a menina passou a ir mal no colégio. “Ela queria
ficar todos os dias na escola depois da aula e contava mentiras para justificar
essa permanência”, lembra Silvana. A mãe, então, decidiu conferir o histórico de
conversas da garota no Messenger. Acabou descobrindo que Patrícia havia
experimentado drogas. “Ela também estava se comunicando com um menino que não
valia nada. Em algumas conversas, ele pedia para ela levantar a blusa e mostrar
os seios na webcam”, conta a mãe de Patrícia.
Silvana teve uma séria
conversa com a filha e, desde então, monitora o que a menina faz na internet.
“Pelas respostas, acredito que ela não tenha mostrado nada ao menino, mas se eu
não tivesse pego, não sei o que poderia acontecer”, diz a servidora. A
preocupação de Silvana é compartilhada por boa parte dos pais de adolescentes.
Nas últimas semanas, notícias revelaram casos do chamado sexting entre
brasileiros na faixa dos 12 aos 18 anos. A expressão – uma soma das palavras
inglesas sex (sexo) e texting (envio de mensagens) – traduz a troca de imagens e
textos sensuais por adolescentes por meio da web, em salas de bate-papo, sites
de relacionamento e comunicadores instantâneos.
Rodrigo Nejm, diretor de
Prevenção da organização não-governamental SaferNet, especializada em segurança
na rede, afirma que o sexting não é recente, mas hoje há mais facilidade para
praticá-lo. “Antes, para mandar uma foto sensual a alguém, era preciso ir até
uma loja e pagar pela revelação. Isso sem falar que a imagem passaria por mãos
desconhecidas nesse processo”, comenta Rodrigo. Com a popularização da web, essa
etapa foi praticamente eliminada. “Hoje, há também uma imensa valorização do
corpo, programas de TV de grande audiência que ressaltam o quanto é bacana
mostrar sua intimidade”, diz o especialista. “Essa superexposição é um prato
cheio para a garotada que busca autoafirmação”, completa.
O psicólogo
Alexandre Pill, do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática (NPPI) da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, lembra que a maioria das pessoas
– tanto menores quanto adultos – não têm noção do alcance da web. “A internet
amplifica a perda de controle. Você pode até tirar a roupa sem mostrar o rosto,
mas pode ser reconhecido por alguma marca de nascença, pelos móveis do quarto”,
exemplifica o especialista. Outro problema, destaca Alexandre, é que o material
que vai parar na rede pode ser copiado por administradores de sites de
pornografia, mesmo os que garantem usar apenas imagens de maiores de
idade.
O destino das fotos e dos vídeos é tão incerto que pode, até
mesmo, prejudicar o futuro dos jovens. “Na web, qualquer ação se eterniza, não
fica restrita àquele momento”, aponta o diretor de Prevenção da SaferNet.
Rodrigo Nejm lembra que, para entrar em carreiras públicas, há uma investigação
da vida pregressa do candidato. E empresas privadas usam redes sociais para
conhecer o perfil de futuros empregados. “Imagina o que se pode pensar de alguém
que divulga sua intimidade na web. Se essa pessoa faz isso com o próprio corpo,
talvez não tenha cuidado nenhum com informações da empresa”, exemplifica
Rodrigo.
Menos comum, mas ainda assim possível e merecedor de atenção, é
o risco de isso desencadear algum tipo de violência. Muitas vezes, o sexting não
é uma troca íntima entre pessoas próximas – algo que, pelas características da
internet, já é imprudente –, mas pode ocorrer entre quem se conhece apenas
virtualmente. Como não se sabe quem, exatamente, é aquele outro que está
assistindo ou lendo, não é possível descartar que seja alguém
perigoso. [Fonte: AN]
*Nomes fictícios a pedidos das entrevistadas.
Como ter mais segurança:
A receita para garantir mais segurança é velha, dizem especialistas: se
aproximar dos filhos. “A internet acaba sendo o grande desafio dos pais, porque
os jovens, certamente, dominam essa ferramenta e podem arranjar inúmeras
maneiras de burlar o controle da família”, diz o psicólogo Alexandre Pill. Nesse
caso, o melhor a se fazer é tentar entender o que acontece na vida do
adolescente.
A professora Gisela Carneiro, 33 anos, adota o diálogo na
relação com o filho Ariel, 12. “Sempre converso com ele, oriento a ter contato
somente com amigos conhecidos. Procuro observar o histórico da navegação, mas
não tenho certeza se ele acessa apenas aquilo”, reconhece a mãe.
Ariel
não se incomoda com o cuidado da mãe, mas reclama quando ela tenta saber o
conteúdo de todas as suas mensagens. Mesmo com a obediência de Ariel, Gisela
reclama que é muito complicado entender os recursos utilizados pelo menino. “Sei
que ele não vai sair por aí se expondo, mas há muitas influências externas e,
nessa idade, eles tendem a fazer exatamente o contrário do que a gente fala”,
diz a professora.
Para evitar que o sexting ocorra, outra dica dos
psicólogos é conversar abertamente sobre sexualidade. “Os jovens usam a rede
para paquerar. Se antigamente as pessoas iam para os bailes e dançavam música
lenta, hoje o flerte é virtual. O sexting dá uma apimentada nisso”, afirma
Rodrigo Nejm, da SaferNet. Para o especialista, a missão dos pais é discutir o
tema sem ficar careta. “A sexualidade existe desde que a gente nasce. A família
precisa debater os limites disso com o jovem”, aconselha.
Para
saber maisE a Justiça?
- Além de se colocar em uma
situação constrangedora, o adolescente que exibe o corpo na internet está
praticando um crime.
- O artigo 233 do Código Penal criminaliza qualquer
ato obsceno exposto ao público. Nesses casos, a apuração do caso fica a cargo da
Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA).
- A prática do sexting
também pode fazer com que o jovem se torne vítima. A Lei nº 11.828 de 2008
alterou dois artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e incluiu a
aquisição e a posse de pornografia infantil na lista das infrações passíveis de
condenação.
- “Esse foi um grande avanço para o País, porque passou a
criminalizar o armazenamento das imagens”, comenta o promotor Renato Barão
Varalda, da Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude do
Ministério Público do Distrito Federal. Renato lembra, porém, que a polícia
ainda enfrenta uma série de dificuldades na apuração de crimes cibernéticos. “Os
agentes precisam de ordem judicial para obter dados cadastrais dos usuários com
os provedores, e isso, muitas vezes, leva tempo”,
aponta.
MemóriaJulho de
2010Sexo via Twitcam
No fim do mês passado, dois
adolescentes gaúchos fizeram sexo e transmitiram as cenas via Twitcam, serviço
de compartilhamento da sua webcam no Twitter. A dupla – um menino de 16 e uma
menina de 14 – disse à polícia que a ação começou após uma aposta em um jogo de
cartas online. Conforme o acertado, a garota teria de tirar uma peça de roupa a
cada vez que a audiência do vídeo aumentasse. Vinte e duas mil pessoas
assistiram à cena.
Outubro de 2009Dentro da
escola
Três adolescentes colocaram na internet cenas de sexo oral
gravadas dentro do vestiário da Escola Estadual Ulysses Guimarães, em Belém do
Pará. Nas imagens, uma estudante aparece com um dos garotos, enquanto o segundo
adolescente está gravando a cena e chega a confirmar que a câmera está ligada.
Depois da divulgação, os três foram remanejados para outras
escolas.
Novembro de 2008No YouTube
Em
Sertãozinho, no interior de São Paulo, cinco rapazes maiores de idade fizeram
sexo com uma adolescente de 15 anos. As cenas foram parar no YouTube e mostram
que, em nenhum momento, há constrangimento no grupo. O Conselho Tutelar da
cidade interveio e confirmou que a garota consentiu com as relações. O caso,
porém, foi parar na Justiça. [Fonte: AN]
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