Coisas e Coisas
A FÓRMULA "LULINHA PAZ E AMOR"
Escreveu Antônio Albino Canelas, a propósito da campanha de Lula da Silva em 2002 para presidente do Brasil, que a "construção da imagem não foi um mero produto de marketing" (p. 54). O director de campanha dele, Duda Mendonça, vai mais longe: "Na verdade, o Lula mudou porque o PT mudou". Em que ficamos? Antônio Canelas, professor de comunicação, explica melhor - foi um processo longo, formulado e construído em termos políticos e mediáticos. Isto parece pôr em causa - ou pelos menos critica - o quadro que tracei ontem, a propósito de S&S (ou os comentadores televisivos portugueses investidos em novas funções). O processo de persuasão televisiva parece ser mais prolongado. Mas acompanhemos mais de fundo o texto que proponho apresentar hoje.
No caso de Lula, que perdera três eleições anteriormente, o empreendimento de mudança foi, para além do político, um maior investimento do PT (Partido dos Trabalhadores) no campo da comunicação. Lula, para ser candidato de novo, exigira ter uma estrutura de comunicação mais profissionalizada! Isto é: o desempenho da equipa esteve presente no uso mais estratégico dos horários partidários não eleitorais, em campanhas publicitárias como "No fundo, no fundo, você é um pouco PT".
Lula=moderado e negociador
A fórmula "Lulinha paz e amor" traduz o enfrentamento e a superação da imagem de um Lula radical, que lhe advinha de uma postura agressiva, crítica, negativa, destrutiva, intransigente, oposicionista. Mas, depois de eleito, Lula cativou e tranquilizou o país. Mostrou, continua a escrever Antônio Canelas, carisma, maturidade, moderação, paciência, tolerância e humildade. A construção da imagem "Lulinha paz e amor" - substituindo a imagem do Lula radical - foi produzida por vários elementos, conjugando a moderação do discurso político de Lula e do PT, a aceitação de compromissos herdados de Fernando Henrique Cardoso e o quase abandono da propaganda negativa e do ataque aos candidatos adversários (o uso intensivo de
jingles e músicas, como estratégia configurada para o horário eleitoral).
Houve um outro deslocamento fundamental: a construção da imagem pública do Lula negociador, também desenvolvida pelo PT e por Duda Mendonça. O próprio Lula constuma dizer que "o que mais fiz na vida foi negociar" (p. 56). Assim, a campanha petista [do PT] posicionou politicamente a candidatura na cena eleitoral de modo muito preciso e pertinente, face a uma conjuntura de crise socioeconómica. A saída da crise requer uma competência política (e não técnica) de conversar com agentes sociais e obter saídas negociadas e alternativas.
Conclusão minha: a televisão - seja o noticiário, seja o programa de campanha eleitoral - exerce uma influência não negligenciável junto das audiências ou públicos, em especial para os que têm na televisão a sua principal, se não a única, fonte de informação.
[o livro aqui referido teve origem num seminário intensivo dado por Antônio Fausto Neto em Buenos Aires em Novembro de 2002. Entretanto, Eliseo Verón fora convidado pela Universidade de Unisinos, estabelecendo-se um acordo com a Universidad San Andrés]
Leitura: Antônio Albino Canelas Rubim (2003). "As imagens de Lula presidente". In Antônio Fausto Neto e Eliseo Verón (org.) e Antônio Albino Rubim
Lula presidente. Televisão e política na campanha eleitoral. São Paulo e São Leopoldo, RS: Hacker e Unisinos
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