Coisas e Coisas
SOBRE O FILME DE JOÃO PEDRO RODRIGUES
De
Odete, o novo filme de João Pedro Rodrigues, lia-se no
Público de 12 de Janeiro que a entrada no circuito comercial francês mereceu crítica elogiosa. Retiro alguns elementos do texto assinado por Ana Navarro Pedro: "conjuga pintura melodramática dos sentimentos e estruturação de um dispositivo abstracto" (
Le Monde); "Grande história de amor mórbida assediada pela sombra hitchcokiana de Vertigo" (
Libération); "Elementos almodovarianos coexistem com uma certa frieza bressoniana, o cineasta tentando compor um universo simultaneamente melodramático e cerebral" (
Libération).
No blogue sound+vision, João Lopes (autor do blogue a par de Nuno Galopim) destaca: "de acordo com elementos divulgados pelo distribuidor português do filme (Lusomundo),
Odete já ultrapassou, entre nós, a barreira dos 10 mil espectadores — trata-se de um valor tanto mais interessante quanto estamos perante um lançamento de escala reduzida (10 salas), para mais num contexto de exibição dominado ainda pelos espectáculos típicos da quadra natalícia".
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Parece haver uma unanimidade em torno do filme. Além disso, as críticas rodeiam a película com referências a outros cineastas, fazendo pensar mais em influências e menos em novidade, como se depreende de Cintra Ferreira, que escreveu no último
Expresso sobre o filme: "As sombras de Douglas Sirk e Fassbinder pairam sobre este surpreendente filme de João Pedro Rodrigues, sobre uma jovem (magnífica Ana Cristina Oliveira) num percurso de «transformação» e «transfiguração» que a leva a assumir o papel do amante de um jovem homossexual".
Se nas críticas francesas, ou o que nos chegou depois do
gatekeeping da jornalista, se fica a entender muito pouco da história, para além das citações cinéfilas, no texto do crítico do
Expresso há um olhar para o fio da narrativa (ao filme, ele atribui 4 estrelas em 5, coisa que o seu colega V. Baptista Marques reduz para 1 em 5 estrelas, prova de que, afinal, não existe consenso).
O filme recordou-me
Alice (2004), primeira longa-metragem de Marco Martins (e que eu reflecti aqui, em 9 de Outubro último), onde se conta a história de uma menina de três anos desaparecida, com os pais a procurarem-na. Aqui, há magníficos desempenhos de Nuno Lopes (Mário) e de Beatriz Batarda (Luísa). O grito lancinante desta ocupa todo o espaço no ecrã.
O que liga
Alice e
Odete, para além dos nomes femininos - o que significa um centrar em marcas de mulheres -, é a ausência de alguém: Alice apenas nomeada e de que conhecemos uma fotografia; Pedro, o jovem que morre no seu automóvel contra uma árvore, logo no começo da narrativa de
Odete. As duas são elo de ligação nas histórias que envolvem homens (Mário em
Alice; Rui em
Odete). Ambos os filmes têm muitos planos nocturnos (mais
Odete que
Alice), o que significa filmes densos psicologicamente, histórias de subúrbios da grande cidade e de vidas tristes ou dramáticas.
- O cinema pode constituir, enquanto indústria cultural, um sinal premonitório da realidade social, cultural e económica. Os filmes portugueses estreados vão do melancólico ao negro, desesperançados e violentos, de uma certa forma, pois nos obrigam a ficar encolhidos na cadeira enquanto assistimos à projecção das imagens e a sair apressadamente do cinema e com ar cabisbaixo, de culpa. É evidente que uma produção de seis a sete filmes por ano não nos dá uma tendência de sentido do cinema português, mas falta-nos alegria, comédia, confiança nas nossas capacidades e criatividade. Ou o mundo do cinema é um aparte da realidade social - e não passa de puro fingimento?
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