Coisas e Coisas


RELAÇÕES PÚBLICAS E PUBLICIDADE EM AL E LAURA RIES

Al Ries e Laura Ries, pai e filha, são sócios de uma firma com o seu nome, em Atlanta, Estados Unidos, a qual trabalha para grandes empresas mundiais na primeira daquelas duas áreas. Em português têm, do meu conhecimento, dois livros, A queda da publicidade e a ascensão das relações públicas (Notícias Editorial, 2003, com prefácio e tradução de Luís Paixão Martins) e A origem das marcas (Casa das Letras, 2005, com adaptação e prefácio de Pedro Celeste). Nesta entrada vou analisar a primeira destas obras.

Posicionamento, credibilidade, criar e defender uma marca e as relações públicas (RP) como actividade criativa são alguns dos conceitos desenvolvidos logo no começo do livro. E, depois, vêm nomes (p. 171) e perda de importância devido ao uso da extensão e linha de uma marca (p. 193).

Desde a primeira página, há uma declaração de princípios: para os autores, são as RP que constroem marcas, cabendo à publicidade manter as mesmas marcas após criação e sua sedimentação pelas RP. Assim, empresas como The Body Shop, Amazon.com, Yahoo!, Google, Playstation, Harry Potter e Microsoft - para recordar as mais divulgadas do público português - foram conhecidas graças às RP e não pela publicidade (p. 16).

Isso conduz à principal conclusão do livro, profusamente repetida ao longo das 256 páginas, da subjugação da publicidade às RP. A publicidade é vista como um desperdício de dinheiro, pois a multiplicidade de mensagens ao longo do dia e nos diversos media elimina qualquer possibilidade de atenção. Al e Laura Ries entendem mesmo que a publicidade perdeu o seu espaço, pois os anúncios são vistos como obras de arte que se candidatam a concursos e ganham prémios. O que importa à publicidade é o reconhecimento dela em si e não o aumento das vendas e ganhos dos produtos e marcas que anunciam. Dizem: os directores de arte da publicidade são mais directores visuais ou gráficos que modelam as campanhas seguindo tendências da pintura (p. 37). Daí, irem aos museus de arte e ao cinema para se inspirarem frequentemente. Criativo é, aliás, uma espécie recorrente de sinónimo da publicidade.

Ora, as RP são as que realmente criam na mente dos potenciais consumidores uma categoria ainda não existente que os encoraja a aderirem à nova marca. Uma marca é a percepção gravada na mente do consumidor potencial, reforçam os Ries (p. 87). Não é o anúncio que proporciona essa mudança mental, mas os media e o passa-palavra, que operam no domínio das RP. Isto porque um anúncio não pode ser um argumento mas um recordatório (p. 97).

O difícil, nas RP, é o tempo de construção de uma imagem. Em vez de uma posição holística nos media em geral e onde se investem largas somas de dinheiro, como na publicidade, as RP alargam lentamente a sua influência. Por isso, o termo de posicionamento, onde as notícias sobre uma marca ou produto surgem num meio de informação mais pequeno e restrito, passando, se houver um bom conteúdo, para media mais populares e abrangentes. Os autores aconselham que, nas RP, haja uma associação entre o produto ou marca que se pretende notabilizar e um porta-voz com poder dentro da instituição, que pode ser mesmo o seu presidente. Este deve, deste modo, dispender cerca de metade do seu tempo em actividades de RP (para estar em contacto permanente com os seus accionistas e consumidores).

A quarta e última parte do livro aparece dedicada à comparação entre publicidade e RP, com aquela a ser espacial, usar a grande medida (investimento publicitário elevado), ser visual, atingir toda a gente, ser dirigida por si própria, cara, favorecer extensões de linha (a mesma marca para produtos distintos), ser divertida mas não criativa ou credível, ao passo que as RP são lineares, de construção lenta, verbais, não atingem toda a gente, são dirigidas pelos outros, custam pouco dinheiro, apoiam as novas marcas, são sérias mas criativas e credíveis.

Apesar da leitura agradável e do modo como constrói a mensagem - e que é certeira: a publicidade não é tudo; se calhar é pouco - noto uma contradição no livro, aliás espelhada na capa. O domínio da mensagem do título é conferido à publicidade, conquanto antecedida pela palavra "queda", ao passo que a "ascensão da RP" aparece em tipo mais pequeno de letra. No interior do texto, não deixei de reflectir no exemplo da Volkswagen (pp.204-205). Al e Laura Ries argumentam que a popularidade do Carocha nos Estados Unidos se deveu às RP.

É bom comparar esse exemplo com o analisado por Waly Olins (A marca, 2005, Verbo) [ver minha entrada sobre este livro, escrita em 14 de Setembro de 2005, aqui], que dedica um longo capítulo à marca alemã e fala noutros moldes: símbolo, ícone, valores (economia, parcimónia, bom senso) (Olins, p. 35). E defende a marca como bem intangível, irracional, emocional e altamente volátil. Ou seja: não há uma construção rápida como na publicidade, mas também não parece existir uma determinação na construção de uma marca. A marca que triunfa ganha devido a múltiplos factores, em que entra a sorte em simultâneo com o risco e a persistência, elementos sociais, psicológicos, culturais, económicos e políticos. Olins também escreve sobre a extensão de marca ou linha de produtos (p. 101), mas prefere falar num tripla tipologia de marcas pp. 194-195): 1) corporativa ou monolítica, onde uma marca cobre a multiplicidade de produtos, 2) validada, quando uma organização se distribui por uma série de marcas, 3) individualizada, se uma marca é vista independentemente da ligação à instituição (holding).

Isto é: enquanto os Ries chamam a atenção das empresas para investirem nas RP e na criação, a longo prazo, de valores e da responsabilidade social, Olins prefere ver as combinatórias das marcas mas sem uma preocupação tão nítida entre actividades de comunicação e promoção dessas marcas. Se este último autor tem mérito, o trabalho dos Ries complementa as preocupações das empresas hoje, que se confrontam com a eficácia da publicidade, num mundo onde quem vê televisão faz zapping quando surgem os blocos de anúncios, obrigando a incorporar as marcas em product placement (dentro dos programas) ou em sítios nobres dos media (como o exemplo recente da publicidade no Público sobre o título do jornal).



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